quinta-feira, 30 de maio de 2013

Autobiografia de Irundy Dias ( p 25 )

Nos meados de agosto de 1957,soube que um grupo de cidadãos desta Cidade, estava sempre se reunindo, com o objetivo primordial de conseguir junto às autoridades competentes  no âmbito estadual, a instalação do curso ginasial, o que viria a beneficiar inúmeras famílias locais. Posso com toda a segurança destacar os principais nomes daquela empreitada memorável, sem citar ordem alfabética, nem tampouco por suas atuações no enredo de toda a história. Vamos lá: Dr. Ruy Alberto de Assis Espinheira,  advogado que militou por muitos anos nesta Cidade de Poções, que aqui constituiu a sua família, chegando até a construir a sua casa à Rua Itália, onde com toda a sua energia e bons propósitos, colocando na época, como uma das melhores construções, já vistas nestas plagas. Ele também, participou da política local, como figura central em diversas ocasiões, candidatando-se a Deputado Estadual. Outra figura exponencial, foi o Sr. Miguel Lopes Ferraz, que por algum tempo ocupou o cargo de Gerente do Banco da Bahia, com a Agência sediada em Poções. A sua filha Cleide Ferraz, foi citada em linhas atrás, quando os estudantes de Poções, que faziam os seus cursos em outras cidades, participou de um lindo show realizado no Cine Santo Antônio, deixando gratas recordações  as todos. O Sr. Corinto Sarno de origem italiana, que batalhou incessantemente pela implantação do curso ginasial e como desenvolveu diversas atividades em Poções, chegou a receber em certa ocasião, uma Comenda Especial, pelos seus feitos em prol deste Município Hidelbrando Alves Rocha, o popular Deco Rocha, ex-gerente do antigo Cine Glória, onde hoje funciona a agência bancária do Bradesco, que juntamente com o seu sogro Antônio Castro Dourado Primo(seu Dourado),que foram os grandes baluartes na busca incessante, junto à Secretaria da Educação e ao próprio (CEE) Conselho Estadual da Educação. Lembramos também, da figura sempre solícita de Arnulfo Ramos Silva (Lulu), que mais tarde foi Prefeito de Poções e muito contribuiu, mais adiante, com uma ajuda substancial  para a sobrevivência do próprio colégio e numa determinada data, fizemos uma festinha singela, para dedicar-lhe os nossos agradecimentos, colocando o seu nome numa das placas das salas de aula. Entre outros nomes aqui não destacados, esses acima, foram os principais baluartes do aparecimento do ginásio aqui nesta cidade e sempre é bom frisar, porque a memória do povo é curta e em breve estarão perguntando como é que tudo isso começou?                                

                                                            Você sabia  ?
que alguns pais que tinham algum recurso financeiro, colocavam os seus filhos a estudar no Ginásio Taylor Egídio em Jaguaquara(que era o melhor na época, por essas bandas) ou em algum outro em Vitória da Conquista ?
que outros pais que também tinham parentes nessas cidades citadas, enviavam os seus pupilos, para dar-lhes
mais ensinamentos?
O que ocorria então em Poções ?
As crianças concluíam o curso primário e desde quando os pais não tinham algum recurso, ou por não possuírem parentes fora desta cidade, deixavam simplesmente de estudar. Poções, por sua vez, crescia vagarosamente, mas crescia...
Os intelectuais, os comerciantes, as pessoas de um bom tino administrativo e outros de boa vontade, começaram a fazer um movimento até que houve a criação da FUNDAÇÃO GINÁSIO DE POÇÕES, órgão que mais tarde, viria a ser o responsável pela implantação do cursop ginasial nesta cidade.
Mas o Brasil daquela época, quando se fala em BUROCRACIA, NÃO MUDOU AINDA EM NADA.
Diz a Enciclopédia  que :"BUROCRACIA é uma morosidade e exigências formais no desempenho dos serviços públicos".
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Pois a tal da burocracia emperrava o andamento dos papéis nas repartições estaduais de tal modo ,que dois amigos nossos Hidelbrando Alves Rocha (Deco) e Antonio Castro  Dourado Primo,( Seu Dourado ), residentes em Salvador, mas com vínculos fincados nesta terra, se desdobraram para conseguir o andamento da papelada. Depois, veio a parte física. Onde iria ficar  instalado o ginásio? Como conseguiriam  os funcionários principais? E o  mais importante: onde encontrar o corpo docente? E nessa lenga lenga, nesse sobe e desce, o tempo corria célere.  E 1957 foi embora.
O Ano de 1958 começou e os trabalhos entraram novamente naquele ritmo de vamos, vamos...
Após o Carnaval, a nossa Diretoria começou a trabalhar par realizarmos a nossa última festa, visto que em julho, o nosso mandato estaria extinto. Por sua vez o Tesoureiro mudou-se daqui de Poções e o Fidelis Sarno, como Presidente, solicitou-me para acumular os cargos de Secretário e Tesoureiro, até o fim de nossa gestão Fidelis comprou um rádio possante num determinado dia de maio, reuniu a Diretoria e disse:
---Caso o Brasil se classifique para o jogo final, nós iremos ouvir a irradiação aqui dentro do Clube.

O Brasil inteiro começou a se movimentar para acompanhar os jogos, visto que  dois fenômenos surgiam no cenário futebolístico: Pelé e Garrincha, eram o mais cogitados, mas no primeiro jogo do Brasil contra a Áustria, o técnico Vicente Feola,  achou que os mesmos eram ainda muito novos para encarar uma Copa do Mundo, pois não tinham experiências de grandes jogos. Mesmo assim, nós vencemos por três a zero. No segundo jogo, a Inglaterra impôs um ferrolho total e o placar ficou em zero a zero. Mas no terceiro jogo, contra a Russia, Garrincha deixou os seus adversários zonzos e com dois gols de Vavá aos 3 e 33 minutos nos classificamos para as quartas final. Dali para a frente o time pegou um embalo tremendo e fomos jogar a final contra os donos da casa, os suecos.


Dobramos à direita, embora muitos quisessem seguir até a Rua São José. Na  casa do Sr Louro, nem também na residência Dr Aloysio Rocha, ninguém para saudá-los, entretanto Padre Honorato, estava no alto da escada, sentado na sua cadeira, acenando para nós, quando passamos naquela gritaria total. Dali fomos direto para  bar do Sr. Anjulino Nápoli. Como eu estava com uma fome incrível, desvencilhei-me do grupo sorrateiramente, deixando a turma solicitando mais bebida. O resto não sei o que mais aconteceu. Mas que foi uma manhã diferente e gostosa foi...
No princípio de julho, para encerrarmos o nosso mandato, na direção do clube social, fizemos uma festa de arromba e solicitamos a presença dos componentes do conjunto, nas pessoas de: Alcides Tourinho no trombone, Zelinho Fagundes no saxofone , Otoniel Monteiro Costa no trompete, Hélio Virote no pandeiro, Cidinho Foca no violão , Armando Araújo na bateria e ainda contamos com a presença surpresa de Evangelista, que algumas vezes aparecia aqui em Poções e nos brindava com o ar de sua graça. Gente, ainda com aquele gosto de campeão, realizamos uma festa espetacular, tamanha a empolgação do pessoal. Basta completar dizendo que houve até Carnaval, em pleno mês de julho.
Não sei dizer se pelo motivo acima exposto, quando houve a nova eleição dias depois, para surpresa nossa, a mesma diretoria foi reconduzida a uma nova gestão.
Aproveitei o embalo e fui até Salvador para comprar uma geladeira, solicitando a Jerry Lago que a trouxesse no seu caminhão, desde quando na casa onde adquiri a mesma, eles não remetiam para o interior..

Ao regressar, avisamos ao Sr. Jambinho, que havíamos marcado a data do nossos casamento para o dia 20 de setembro, que cairia num sábado. Meu futuro sogro recebeu a noticia numa boa. Entre namoro e noivado, haviam se passado seis anos rápidos e nós não estávamos “enrolando”, Como o próprio Sr. Jambinho havia pedido, para não termos pressa, aquele já era o tempo suficiente. E aí, o próximo passo seria  arranjar uma casa para alugar, que não ficasse muito longe do centro da cidade. Por sorte nossa, em fins de agosto, uma pequena casa pertencente ao Sr.Luiz Sarno, localizada na Praça do Obelisco, foi desocupada e Tavinho foi o portador daquela notícia. Sem perda de tempo, no dia seguinte fomos ao Armazém do Sr. Luiz Sarno. Bonachão, como quase todos da família Sarno que eu conheci, recebeu-nos com um sorriso largo, procurando saber da minha visita ao local, onde várias mulheres trabalhavam selecionando os grãos de café,  num frenético vai e vem de mãos habilidosas. Perguntamos sobre a casa em questão e ele nos respondeu que alugava, contanto que a limpeza fosse por minha conta. No dia seguinte, ao recebermos as chaves da casa, fomos vê-la e constatamos que para começar a vida a dois, já era o suficiente. Era assim a casa: logo após a porta de entrada, havia um pequeno corredor, tendo ao lado direito uma porta, que dava acesso ao quarto da frente da casa, cujas janelas estavam voltadas para a rua. Ao final do corredor, via-se uma sala pequena, à esquerda e uma outra porta a direita, que mostrava um segundo quarto, contíguo ao primeiro. Ao lado direito daquela sala um porta que nos levava à cozinha. Seguindo em frente e a esqiuerda, uma pequena área, que mais adiante transformamos numa copa, para utilizar as nossas refeições. Havia um banheiro fora do corpo principal da casa,  cuja porta ficava em frente a uma figueira.\dali para o fundo era somente quintal. A casa em si, estava pessimamente cuidada, parecendo uma pocilga. Basta citar que os últimos moradores da casa, levaram as lâmpadas e inclusive os bocais, quando tivemos de fazer essa despesa a mais, que não constava do nosso PARCO orçamento.

PARCO: Que poupa. Que economiza. Escasso. Minguado.


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Depois de fazer a primeiras limpezas, contratamos um pintor, que estava nessa Cidade efetuando alguns serviços. Mas o mesmo era proveniente de Feira de Santana e provavelmente percebendo que nós éramos ingênuos, tipo “ marinheiro de primeira viagem”, fez um orçamento astronômico, digamos, um mil e quinhentos cruzeiros, para um trabalho que deveria valer, pouco mais  de duzentos.
Não me vangloriei pelo que aconteceu  ,mas soube que dias depois de ter concluído o meu serviço, numa outra casa, o pintor foi subir numa escada, escorregou, caindo de mal jeito e fraturou a bacia.
Assim que a casa ficou prontinha, começamos a levar todos os utensílios já comprados, armando-os e colocando nos devidos lugares, para nos receber assim que nos casássemos..
Com Dona Odete Lago França, Oficial do Registro Civil, preparamos toda a papelada, para que o Padre Honorato do Nascimento Andrade, celebrasse o casamento religioso, com efeito civil
Acontece porém, que no dia aprazado, ou seja, 20 de setembro de 1958,ali por volta das 17 horas, chegou à residência dos meus pais, um rapaz, enviado que foi por Dona Odete, alegando que o Dr. Ignácio de Almeida Moura, Juiz de Direito da Comarca, por sinal, muito amigo nosso, sentiu-se enciumado e mandou avisar, que ele mesmo, faria o casamento civil e não na Igreja como estava programado.
O fato é que às 19 horas, Papai, Mamãe e eu, chegamos à Igrejinha e como acontece sempre em Poções, não havia ninguém. Sei, que aos poucos, os convidados foram aparecendo, tomando por completo o recinto, sendo que os mais retardados, tiveram que ficar do lado de fora.
Após as vinte horas, surgiu à porta da Igreja a minha Nó, sendo conduzida pelo seu pai, o Sr. Jambinho. Como o Padre Honorato já fora avisado, depois da celebração religiosa, fomos à residência do Sr. Jambinho e logo na porta, algumas mocinhas, amigas de Noélia, começaram a jogar muitos grãos de arroz em nossas cabeças.( Dizem os entendidos que o ato de jogar o arroz, sobre os nubentes, traz sorte). No nosso caso, deu muita sorte mesmo.
Dentro da residência, sem que tivesse um local apropriado, para efetuar o casamento civil, desde quando o Dr. Ignácio resolveu tudo em ultima hora, Dona Odete, conseguiu reunir as testemunhas e nos levou a uma das salas menos movimentadas, para que fosse realizado o casamento civil.
Na área situada nos fundos da casa, que já fora cimentada há muito tempo, foram colocadas diversas mesas, para que os convidados ficassem bem à vontade. No lado esquerdo daquelaárea, havia quatro quartos pequenos, que serviam às vezes, de dormitórios, mas somente dois deles, estavam servindo para tal. Os dois restantes estavam completamente abarrotados de salgadinhos, doces e bebidas. Do lado direito seguindo de frente a fundo, encontrava-se uma copa de regular tamanho, onde os familiares no dia a dia realizavam as suas refeições comuns. A seguir, via-se uma cozinha ampla, com diversas prateleiras, onde eram colocadas as panelas de todos os tipos e tamanhos. Logo depois, outra cozinha, onde havia um fogão que se cozinhava com achas de lenha.
 Como em toda a festa, há aquele ar cerimonioso, onde os convidados são uns santinhos, esperando serem servidos pelos garçons e familiares da casa. Mas o que eu vi umas duas horas depois, foi o suprassumo do assanhamento. As pessoas sem modo ou acanhamento avançavam nas bandejas, tirando para si e para outras, em volta da mesa, pilhas e mais pilhas de salgadinhos.

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Aquelas que ainda não haviam conseguido mesas para se sentar, porque chegaram atrasadas, ou por não terem sido convidadas, e entraram como “caras de pau”, ou “penetras”, eram as piores, pois, entravam naqueles dois quartos citados, e pegavam salgadinhos, doces e bebidas, sem a menor cerimônia. Nunca eu tivera a oportunidade de verificar de perto um casamento e fiquei estarrecido com o que vi. As pessoas pareceram-me que estavam esfomeadas. O quarto onde foram depositadas as bebidas teve que ser trancado, porque muitas pessoas pegavam bebidas dos mais variados tipos e saiam pela porta lateral da casa, levando consigo garrafas e mais garrafas cheias. As passar da meia noite, já envergonhado, com o que vira até então, chamei Nó e sorrateiramente fomos embora. Alguns parentes até que se ofereceram em nos acompanhar, mas agradecemos e seguimos sozinhos. Dali, até a nossa casa alugada, eram cerca de em metros. Finalmente chegamos em casa e ficamos completamente sós...
Eram quase sete horas da manhã, quando ouvimos  certo movimento musical do lado de fora da casa, justamente em frente ao quarto que escolhêramos para dormir. Acordamos, mas fingimos, estar dormindo. Pelo zum zum zum lá fora, sentimos que fora o Dr. Ignácio Moura, que residia ali próximo, reunira uns amigos nossos e com a sua inseparável flauta, organizaram uma espécie de serenata em pleno dia. Já pensaram, como naquela época, acontecia cada coisa ? o Certo, é que ficaram ali por algum tempo e não sentindo nenhuma reação de nossa parte, se dispersaram.
Como aconteceu há 8 anos  atrás, no dia[i] seguinte ao casamento de Amélia, a história repetiu-se. O Sr. Jambinho farturento como ele sempre foi, achou de oferecer aos familiares e amigos, um almoço, que foi  iniciado aí por volta das treze horas e se não me esqueci de nenhum detalhe, já com o dia escurecendo, havia ainda gente almoçando, pois muitos que comiam mais cedo, retornavam  e repetiam a dose. O Sr. Jambinho com aquela bondade toda, atendia  aos que chegavam e dizia:
---Entre meu filho ! Já comeu ? Vá lá dentro, peça um prato e  coma à vontade.!
E assim foi a tarde toda, numa movimentação incrível. Gente conhecida, penetra, exploraram da boa fé do meu sogro, sem dó, nem piedade.
Amélia, que praticamente estava à frente de tudo, cercada de algumas ajudantes, estava exausta e em certo momento, queixou-se daquele interminável almoço. Foi então ,que o Sr. Jambinho, mesmo à contra gosto, foi despistando o pessoal que continuava a chegar, dizendo que o almoço já terminara. Passavam das 18 horas.
Como as eleições estavam se aproximando, todos os Partidos políticos de Planalto, em comum acordo, resolveram indicar como  candidato único, para o cargo de Prefeito, o nome do.Sr.. Jambinho. Foi uma indicação justíssima. Pelo  que o pai de Noélia, já fazia pela região que fora recentemente desmembrada do Município de Poções, que foi bem aceita pela população. Entretanto, aqui em Poções .,onde a UDN e o PR, sempre tinham andado de mãos juntas, resolveram se separar e cada qual lançou o seu candidato. O PSD, que sempre fora oposição, sentiu uma grande oportunidade e lançou o nome do Sr. Olímpio de Lacerda Rolim, um comerciante, dono de uma farmácia. Homem de bons costumes, bem querido pela sociedade local, dias depois, viu a sua pessoa ser consagrada nas urnas.

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segunda-feira, 27 de maio de 2013

Tabela da Copa das Confederações(Colaboração de Irundy Dias)


TABELA DA COPA DAS CONFEDERAÇÕES (COLABORAÇÃO DE IRUNDY DIAS)


DIA  HORA  GRUPO      PAÍS                              X   PAÍS                                         LOCAL      
15      16          A          BRASIL                             X  JAPÃO                                BRASÍLIA
16      16          A          ITÁLIA                              X  MÉXICO                             RIO DE JANEIRO
16      19          B          ESPANHA                         X  URUGUAI                           RECIFE
17      16          B          NIGÉRIA                           X TAITI                                   B. HORIZONTE 
19      16          A          BRASIL                             X MÉXICO                             FORTALEZA
19      19          A          ITÁLIA                              X JAPÃO                                RECIFE
20      16          B          ESPANHA                         X TAITI                                  RIO DE JANEIRO
20      19          B          URUGUAI                         X NIGÉRIA                             SALVADOR
22      16         A          BRASIL                              X ITÁLIA                                SALVADOR
22      16         A          MÉXICO                            X JAPÃO                                B. HORIZONTE
23      16         B          ESPANHA                          X NIGÉRIA                            FORTALEZA
23      19         B          URUGUAI                          X Taiti                                      RECIFE

                                                       SEMI – FINAIS

26       16                   1 A                                        X  2B                                      B.HORIZONTE
26       16                   1B                                         X  2ª                                        FORTALEZA

                                                       3 LUGAR
30       13                                                                X                                             SALVADOR 

                                                        FINAL 
30        16                                                                X                                              RIO DE JANEIRO

CAMPEÃO_____________________________________________________
VICE              ___________________________________________________

quarta-feira, 22 de maio de 2013

Autobiografia de Irundy Dias ( p 24 )

No Réveillon de 1954, ainda havia no ar, aquele cheirinho de política, mas felizmente Poções teve sempre em sua história, a vocação de ser uma cidade de paz e de tranquilidade. Tavinho e Amélia dançaram algumas partes. Jurimar ainda continuava de namoricos com o seu primo Vecinho. Nó e eu dançamos o tempo todo. Como era bom dançar à vontade sem ter que ficar amedrontado, como era o caso da pobrezinha da Nó. Ela era e ainda é aquela pessoa fofinha que nós temos de tratá-la com todo o carinho e respeito. Sempre a amei.
Na tarde do dia primeiro de janeiro de 1955, durante a matiné do clube, comemoramos o nosso terceiro ano de namoro e dias mais tarde, relembramos também, o terceiro ano da cirurgia a que ela foi submetida na extração do apêndice. Quando cheguei no quarto do hospital,  encontrei-a alva, da mesma cor dos lençóis. Dias mais tarde, já recuperada daquele susto inicial, via todas as noites, mas notava que ao Aproximar-se da hora de dormir, Nó estava com o hábito de tomar o remédio, para evitar que as dores aparecessem. Fiz vê-la que aquele hábito já estava se tornando um vicio, desde quando já se passavam vários da cirurgia e até os pontos já haviam sido removidos, mostrando uma cicatriz perfeitamente seca. Felizmente ela me atendeu. Essa lembrança, foi se dissipando há medida que os anos se seguiram.
Quando chegamos ao dia 20 de janeiro, observei que Noélia não estava se referindo em retornar a Salvador para a continuação dos estudos. E aí , com muito jeito abordei o assunto:
---Nó, você não vai voltar a Salvador,  para continuar os estudos?
Não é propriamente parar. Vou aguardar o desenrolar dos acontecimentos. 
Também usei logo de franqueza.  --- Você sabe que estou no inicio de minha carreira profissional e ainda por cima de tudo isso, sofro a pressão do outro colega, que quer se arvorar de ser o dono de toda a área. Portanto, casarmos agora, nem pensar.      Noélia respondeu quase laconicamente:
---Não estou pensando em casamento logo, logo.
A fim de não discutirmos sobre o  motivo de minha pergunta inicial, deixamos para outra ocasião continuar aquela conversação.
Por motivo de melhor acomodação, a feira que sempre fora realizada na Praça Deocleciano Teixeira, desde a época de 1939, quando passei aqui pela primeira vez, foi mudada para a Praça da Divino, ficando, praticamente em frente da Igrejinha. Com aquela mudança, até que apareceram mais clientes da roça, provavelmente pela proximidade do gabinete dentário, que ficava bem atrás da Igreja, situado na Rua Felix Gaspar. Mas à medida que foram se aproximando os dias das Festas do Divino Espírito Santo, houve uma pequena complicação com a mistura das barracas da feira, com aquelas que estavam sendo armadas para as Festas. Aproveitaram até uma portinha que havia ao lado do Clube Social, para instalar um jogo de roleta, que na época Havia o consentimento da Polícia e da Prefeitura. Acredito, que o dono da referida roleta, pagava algum imposto, parta usá-la durante as Festas. Num ímpeto de coragem, uns dias antes das festas do Divino, Noélia e eu, combinamos em falar com o Sr. Jambinho. Escolhemos o sábado, um dia após o início do novenário. Amélia fora também preparada para dar todo o apoio possível. Como o Sr. Jambinho tinha o hábito de retornar à sua fazenda, bem tarde da noite, ficamos aguardando o fim do jantar e quando pessoal se dispersou, nos reunimos na sala de visitas. Amélia sentou-se numa das poltronas estufadas, tendo ao seu lado, Noélia, provavelmente para tê-la como uma ajuda se precisasse. Sentei-me defronte delas.

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Em dado momento, o Sr. Jambinho chegou a sala e estendeu a mão para mim. Retribui o aperto de mão, sentindo meu coração aos pulos. Minha pressão arterial que sempre fora baixa, naquele instante deve ter subido um bocado. Quando ele terminou de sentar, não perdi tempo, para não protelar a nossa agonia e fui logo dizendo:
---Seu Jambinho, é provável que o senhor já saiba que namoro com Noélia, há três anos e gostaria de pedi-la em casamento. Quero também que o senhor me dê um prazo, enquanto eu vou me arrumando...
O pai de Noélia, disse que aceitava, mas respondeu de imediato:
--- Meu filho, você vai me dar um tempo. Mais adiante a gente conversa a respeito.
Tudo resolvido! Aquela ânsia acabou e felizmente voltamos à nossa rotina. Mas senti-me culpado em Noélia não ter continuado os seus estudos, para o curso secundário.
Com a chegada das Festas do Divino, numa certa tarde, presenciei Noélia, em companhia de sua prima Irene, subindo no carrossel, para dar umas voltinhas. Basta recordar, que o carrossel daquela época, era movido com empurrão manual dos dois rapazes, que eram pagos para fazer aquele tipo de serviço. Uma terceira pessoa, talvez o dono, ficava no centro do carrossel, tocando sua sanfona, tornando a diversão, muito mais gostosa. Senti, que elas duas divertiram-se a valer, relembrando os velhos tempos de criança.
Antes do final do ano, com segui amealhar uns cinco mil cruzeiros e fui a Salvador, comprar um aparelho de louças. Procurei e achei, justamente na casa comercial de Miguel Vita, um antigo vizinho nosso de iguaí e que já possuía uma loja de artigos domésticos. Perguntei por seu velho pai, o José Vita, mas já havia falecido. Comprei por quatro mil cruzeiros e Miguel Vita encarregou-se de conseguir um meio de enviar a mercadoria para Poções. Ao retornar, num outro dia convidei Nó a ir comigo até Jequié a fim de comprarmos as peças de vidro, como copos, taças, cálices em vários tamanhos. Nó fez até ujma observação:
--- Dy, papai disse que você está indo rápido demais.
--- Rápido como? Todo o dinheiro que eu for ganhando e que estiver sobrando, vou comprar esses objetos  necessários para o futuro.
As caixas com os parelhos de louça e de vidro, foram guardadas num dos quartos vazios que existiam na aérea externa da casa. Com certeza, alí ninguém iria mexer.
O resto do ano de 1955 passou rapidamente e quando menos esperávamos, janeiro de 1956 apareceu e partimos para comemorar o nosso quarto ano de convivência, já agora, entre namoro e noivado. Uns dias depois, estava no meu gabinete dentário atendente aos meus clientes, no período da manhã, quando uma das empregadas da casa do Sr. Jambinho, apareceu para avisar-me que Elizabeth, a caçulinha de Amélia acabara de nascer. Assim que terminei de atender o último cliente, fui apressado para ver a garotinha. Lá chegando encontrei Amélia repousando na cama, com a menininha ao seu lado esquerdo. As três irmãs, Jú , Nó e Té, estavam em volta, paparicando. Assim que terminei de falar com todos, Amélia virou-se para mim e falou:

---Dy, ela se chamará Elizabeth e eu já escolhi Nó e você, para serem os padrinhos.

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Agradeci pela deferência e ficamos ali jogando conversa fora.
Alguns dias depois, com a chegada do Carnaval, ( 12, 13 e 14 de fevereiro), estando no meio de um grupo de rapazes, tentamos introduzir aqui em Poções, algo que nunca tinham visto. Vestimos umas fantasias e nos mascaramos e o mais engraçado de todos foi Humbertão, que com aquela altura que ele possuía, vestiu-se de bebê, com gorro na cabeça, chupeta, babador, mamadeira dependurada ao lado do corpo, fralda e todas as peças com a cor rosa. Com aquelas pernas super- cabeludas, faziam um contraste tremendo em todo aquele visual. Era o destaque principal de nossa turma. Mas a molecada daqui de Poções, nunca viu aquilo e começou a jogar paus e pedras em nosso grupo. Repentinamente, um dos nossos colegas mascarados, que até hoje não consegui distinguir quem foi, tomou uma das varas das mãos de um dos molecotes e deu-lhe umas chibatadas nas pernas, que o mesmo saiu correndo e chorando. Em parte, foi até bom, porque estávamos a mercê deles e poderíamos receber algumas pedradas e nos ferirmos. Mais tarde nos reunimos e concordamos que não sairíamos mais mascarados. Poções, ainda estava com o espírito bem atrasado para certas brincadeiras. À tarde, observamos que uma batucada muito desajeitada, desfilou na Praça Deocleciano Teixeira, onde o povo sem vibração nenhuma, acompanhava, andando nos lados direito e esquerdo, como se estivessem numa procissão. A diferença era que não havia nenhuma reza. A casa, onde funcionava o Clube Social, foi posta à venda, desde quando, o proprietário, o Sr. José Blois, estava de mudança com a família, para São Paulo e deixou o aviso, que aquela seria a última festa. Em vista disso, o pessoal se aprumou e foi realizado um carnaval excelente. Por outro lado, o Presidente do Clube, que era o sargento do Tiro de Guerra, o Sr. Alfred Jacob François, fora promovido a tenente do Exército e teria que mudar-se de Poções, com a sua esposa Wilma Gusmão, esta, prima de Noélia. Com esses dois problemas a resolver, os sócios do Clube se reuniram e escolheram uma comissão, para dirigir os destinos da entidade, até o mês de julho vindouro, quando seria realizada a eleição para a nova diretoria.
Ao amigo, tenente Alfred Jacob François e sua esposa Wilma Gusmão François, apesar do parco tempo que convivi com ambos, quero deixar registrados nessas linhas, o meu afeto, a minha admiração e que essas ternas palavras, sejam dirigidas ao bom Deus, para que sempre os tenham, num, local bem sublime, juntamente aos seus familiares.
Com a chegada das Festas dos Divino Espírito Santo, não vi quase nada de novo. O Pavilhão com as suas mesas reservadas para o pessoal que tivesse uma boa grana, principalmente para gastá-la nos dias do leilão. O bar, alugado a algum comerciante que pudesse atender bem aos fregueses, onde os garçons teriam que se desdobrar, pois nos últimos três dias, o movimento era incessante. Uma pequena área era sempre reservada para o conjunto musical e dançarinos que quisessem se aventurar a sujar os sapatos de terra. A pedido dos próprios dançarinos, nos anos que se seguiram, fizeram alguns metros quadrados cimentados para evitar aquele vexame. No centro da praça o parque de diversões, com as mais variadas peças, a fim de agradar gregos e troianos.. Mesas com jogos de azar, com o consentimento prévio da Prefeitura e da Polícia, que rendiam alguns cruzeirinhos com o arrendamento, atraiam vários apostadores. Como era de praxe, que sempre acontecia todos os anos, o Clube Social, praticamente encerrava os festejos, com a sua festa dançante no domingo, mas naquele ano, a comissão que ficou encarregada, conseguiu organizá-la no salão térreo, onde hoje funciona a Prefeitura Municipal de Poções. Os sócios mais aficionados como Dr. Ruy Espinheira, Fidelis Sarno e sua esposa Juraci, Tavinho com Amélia, como sempre, juntavam as suas mesas. Bernardo Messias e sua esposa Enedite, era outro casal que não perdia aqueles bons momentos de diversão. Lembro-me naquela oportunidade de ver Omar da Rocha e Silva e seu irmão Almir(Miga)da Rocha e Silva, acompanhados de sua respectivas esposas.
                                                            
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Quando o conjunto musical iniciava tocando a primeira parte,  impreterivelmente, Benevaldo de Oliveira Rocha e o Dr. Ruy Espinheira, que na maioria das vezes nunca se apresentavam com as suas respectivas esposas, eram os primeiros com algumas mocinhas que estivessem presentes e sem compromisso imediato. O interessante, era que cada um deles, possuía um modo peculiar de dançar e isso atraía os olhares daqueles que ainda permaneciam sentados. Como Noélia, era um pouco tímida, nem sempre dançávamos as primeiras partes, mas ao chegar a nossa vez, sentíamos que muitas pessoas ficavam nos observando, pela leveza que percorríamos o salão.
. Isso tudo, porque, eu escoladíssimo com as aprendizagens feitas no Rumba Dancing e ao lado de Nó, que era de uma leveza ímpar, desfilávamos, dando um verdadeiro show, Belos tempos, que recordamos sempre, quando vamos participar de qualquer festa, onde haja dança. É claro, que hoje em dia, não dispomos mais, daquela energia de outrora. Os anos pesam nos ombros de qualquer um.
Soube então, que o Sr. Fidelis Sarno, ficaria à frente dos destinos do Clube Social até que fossem realizadas as eleições, no mês de julho, para a posse da nova Diretoria. Foi um fato que estranhei muito. Como é que um Clube realizava eleições no meio do ano? Não seria mais interessante que fosse em janeiro, pois a nova Diretoria, já fazia um planejamento para o ano inteiro. Na época, eu entendia que o ano financeiro não deveria ser confundido com o ano social, mas peguei o barco andando, que fazer ?
Como a Festa do Divino saiu bem ao gosto da maioria quase esmagadora dos sócios, na eleição realizada no mês de julho, conduziram o próprio Fidelis Sarno ao cargo de Presidente, que ele já vinha ocupando interinamente.
O Réveillon e a festa do dia primeiro de janeiro de 1957, também foram realizadas na parte térrea do salão já mencionado e aí cogitaram em organizar o Carnaval no mesmo local. Aí, as más línguas começaram a sussurrar que a estrutura do prédio não iria aguentar, com o barulho que seria feito nas festas carnavalescas. Mesmo com toda aquela pressão, onde diziam o que o prédio iria desabar, o grupo que apoiava Fidelis Sarno , pôs pés firmes e o Carnaval foi realizado alí mesmo obtenho uma frequência acima das expectativas.
Quanto ao prédio, resistiu tão bem, que ainda hoje funciona tranquilamente o Executivo Municipal. E por tocar nesse assunto, a Prefeitura funcionava numa casa alugada à família Sarno bem próxima à Praça Deocleciano Teixeira. O Prefeito ainda era o Dr. Aloysio Rocha que não possuía secretários. Apenas o tesoureiro, na pessoa do Sr. Alcides Fernandes da Silva é quem fazia todos os serviços da Prefeitura, sendo ajudado por poucos subalternos. A penúria era tanta, pois as verbas eram curtíssimas e a arrecadação ficava muito a desejar.
Por sua vez , a Câmara de Vereadores funcionava também numa casa alugada ali perto, onde hoje funciona o escritório da Embasa. Os vereadores Ary Alves Dias,(meu pai) e o Sr. Diolino Xavier Luz eram os mais assíduos. Como funcionários, a senhorita Josina Leoni (Doninha),desempenhava o papel de secretária, enquanto o Sr Arnaldo Lago Fagundes era o principal e único ajudante dos serviço daquela Casa de Leis. Arnaldo era um exímio saxofonista e às vezes participava da banda musical da Cidade, em alguns eventos.
Na época, Iguaí e Ibicuí que haviam sido distritos de Poções, conseguiram a sua emancipação política e Poções então passou a ter no corpo do seu Legislativo, apenas 11 vereadores, sendo que foram eleitos dentro do próprio Município e os outros três galgaram a eleição pelo distrito de Nova Canaã.
Meu pai, Dr. Ary Alves Dias, começou o seu ingresso na política desde a época, quando morávamos em Iguaí. Ele, o Sr. Manoel Martins de Souza, alta figura representativa daquela Vila e o Sr. Carlos Ribeiro Freire( que mais adiante foi eleito Prefeito do local), sempre figuraram como vereadores.

                                                       
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Com a mudança da família para Poções, Papai continuou atuando e sempre era reeleito vereador. Apenas por curiosidade, certa feita eu o vi escrevendo umas cartinhas e colocando-as em uns envelopes azuis e então perguntei
---Pai, o senhor está tirando as contas do pessoal que está devendo a farmácia?
---Não, seu Dy, estou escrevendo aos meus eleitores, dizendo aos mesmos que sou candidato a vereador nas próximas eleições.
---E quantas dessas o senhor enviará?
---Ainda não contei, mas acredito que chegarei a mandar umas duas mil cartinhas.
Espantei—me com a quantidade e repliquei:
---Pai, duas mil cartas?!!! Então ...
---Então nada --- respondeu Papai --- dessas duas mil, se eu conseguir uns duzentos votos, contarei como vitória. Você sabia que o eleitor é muito infiel? Além dos votos matematicamente certos, você tem que calcular, aqueles que poderão vir das promessas feitas aqui ao pé do balcão, ou ainda daqueles que eu atendo  lá no Posto de Higiene. Daí, eu tiro uma média e presumo se vou ser eleito ou não.
Bom político ou bom matemático, o certo é que o “velho” foi vereador em Poções, cerca de 20 anos. Nunca perdeu a chance de ser eleito vereados, desde as primeiras eleições ocorridas à parti de Iguaí. Depois que ficou cansado de pedir voto para sí, apresentou como candidato, um enfermeiro que trabalhava no Amianto, por nome Valdomito Galvão Ferreira, elegendo-o vereador tranquilamente. Na eleição seguinte, como Valdomito foi exercer o seu trabalho fora de Poções, Papai apresentou e elegeu Romano Schettini sem nenhuma dificuldade. Mais adiante, outro primo de Noélia, por nome Raimilson Gusmão, que possuía certo reduto de votos em Agua Bela, solicitou de Papai um pequeno apoio e também foi eleito. Nessa história toda, para concluir, poderemos acrescentar que durante todo o tempo que Papai exerceu o cargo de vereador, nunca recebeu um centavo, como acontece de uma certa época para cá, onde os  senhores vereadores recebem o seu numerário mensal ,enquanto o Presidente, ainda ganha uma verba de representação. Sinais dos tempos.
Numa determinada ocasião, quando da proximidade dos Festejos do Divino Espírito Santo, observei um quadro interessante, na residência do Sr. Jambinho. Num sábado, antes dele retornar à fazenda, as quatro filhas, reuniram-se com o mesmo, em volta de uma mesa, expondo um orçamento que elas necessitavam, para participar dos referidos festejos. Amélia, já casada e como irmã mais velha, era a porta voz do grupo e Seu Jambinho, sentado, já com o chapéu na cabeça, pois instantes depois iria para a fazenda, ouvia calmamente a exposição de motivos que as meninas faziam. Ao final da reunião, Seu Jambinho disse:
---Segunda- feira trarei o dinheiro, para que vocês possam ir a Conquista.
No dia escolhido, fiz companhia a Amélia e Noélia, naquela viagem horrorosa. A estrada como cheguei a relatar em linhas atrás, era toda esburacada, com péssimo encascalhamento. Saímos num ônibus que gastou três horas daqui a Conquista, porque era um dia de sol e a viagem foi normalíssima. A parada do ônibus era na porta de uma casa, que ficava em frente ao Hotel Albatroz. Saltamos e descemos o restante da ladeira e na Praça Barão do Rio Branco. Hospedamo-nos numa pensão. Devido a poeira que fez durante a viagem, fomos forçados a tomar um novo banho e trocar de roupa.

                                                                  
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Assim que todos nós estávamos prontos, seguimos para as lojas a fim de comprar o que era de necessário para elas duas e as irmãs Jurimar e Tereza, que não nos acompanharam. Aqui escrevendo é muito fácil dizer que as compras foram feitas e ao final da tarde tivemos ainda um tempinho para passear e já anoitecendo, voltarmos à pensão para fazer as refeições e dormir cedo, pois no dia seguinte teríamos que levantar bem cedo para pegar o ônibus naquele mesmo local e além de tudo, com as maletas abarrotadas de compras.
Chegando em casa, Jurimar e Tereza ficaram satisfeitas com as compras que as suas irmãs fizeram e se não gostaram, pelo menos não demonstraram.
As Festas do Divino ocorreram na maior animação e tranquilidade e em julho, Fidelis Sarno foi eleito Presidente do Clube, pela maioria dos sócios presentes. Dias depois, toda a Diretoria eleita, foi a residência do Sr. Alcides Fagundes da Silva, ex-Prefeito de Poções, no período 1951/ 1954 e naquele momento, era o principal responsável, pelo prédio da SUC( Sociedade União das Classes), entidade já extinta, porque os sócios ao longo dos anos, deixaram de pagar as suas mensalidades e dessa forma, só ficou o prédio, como patrimônio. Fomos bem recebidos e ao fim de uma não demorada conversa, o Sr. Cidinho, como era mais conhecido, nos forneceu a chave e fazendo votos que a nova Diretoria, erguesse bem mais alto o Clube Social. No dia seguinte, fomos conhecer de perto o que seria, por alguns anos afora, a sede do nosso Clube .Era uma casa e ainda é hoje, com algumas mudanças, composta por um vasto salão, que abrigaria uma maior quantidade de mesas e cadeiras, que viria a proporcionar aos associados e seus familiares, um pouco mais de  conforto.(Vale salientar, que no outro Clube, no máximo, comportava 27 mesas, quando a festa era de casa cheia.).Do lado esquerdo do salão, havia uma porta que dava acesso ao toalete feminino. Do lado direito, seguia-se diretamente ao bar e dali uma outra porta, que nos fundos acessava ao sanitário masculino. Entre as duas portas citadas, haviam construído uma parte mais elevada, onde se alojava o conjunto musical. Somente do lado direito, existiam janelas que eram voltadas para um pátio e este se comunicava desde a porta da rua, aos fundos da casa. Felizmente havia um forro que cobria por extenso todo o salão. Estava o prédio abandonado por falta de quem o usasse, mas com alguns retoques, poderia apresentar-se satisfatório ao sócio mais exigente que fosse. Na primeira festa que fizemos somente para fazer uma estreia auspiciosa, convidamos os músicos da terra. Deles, posso recordar-me das figuras de Arnaldo Lago Fagundes, ora com o seu saxofone e às vezes com o clarinete. O inesquecível amigo de muitas jornadas, Gisélio Fagundes (Zelinho), com o seu aprumadíssimo saxofone. Otoniel Monteiro Costa, com o seu inseparável trompete. Nas horas de trabalho não musical, com a sua tesoura mágica e a sua máquina, costurava várias peças de roupas masculinas, lá no Beco dos Artistas. Alcides Tourinho, que além de músico, tinha uma tenda de alfaiate, alí vizinho da Caixa Econômica dos dias de hoje. Tocava com  muito amor o seu estridente trombone. Todos esses citados, Deus já os levou para ficar consigo, quem sabe, alegrando o ambiente lá no céu, com outros músicos, do tipo de Cidinho Foca, que ao dedilhar as cordas do seu violão, transmitindo aquele som lindo e suave. Outros, apareceram e se foram deixando um vazio não só no que se refere ao vasto repertório musical que possuíam, mas o elemento físico, onde cada um, com o seu próprio modo de ser, nos deixou inúmeras saudades aos seus parentes e amigos. Eles faziam parte de um conjunto sem nome, mas deixaram um legado a Poções, que jamais serão esquecidos.  Você que está lendo essas páginas, recorda-se desses conjuntos que aparecem várias vezes por aqui, não é isso mesmo ? Agora, faça uma severa comparação e me responda sinceramente se o conjunto de Zelinho, Arnaldo, Otoniel, Foca ,Alcides e outros mais, não dariam de dez a zero ?

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terça-feira, 7 de maio de 2013

Autobiografia de Irundy Dias ( p 23 )



Na  sexta feira  ,no sábado e no domingo à noite, quando não aparecia nenhuma programação extra, sempre ficávamos num jardim situado em frente ao Palácio da Aclamação, outrora a residência oficial do Governador do Estado da Bahia e alí ficávamos algumas horas, trocando juras de amor.
Sempre aos sábados, quando voltávamos ao pensionato, Nó ia se recolher, enquanto Pedro Ferraz, Vilobaldo Macedo, Nino e eu, íamos jogar canastra apostando-se um copo de vitamina, onde a dupla perdedora pagaria a despesa total. Muitas vezes, cerca de três horas da madrugada, quando o jogo acabava, descíamos pé ante pé, vagarosamente, as escadas de madeira, pois o rangido dos degraus, poderia incomodar o pessoal que estava dormindo e saíamos até uma lanchonete próxima a Faculdade de Direito, onde tomávamos uma vitamina de frutas.
Nas semanas que Nó não tinha folga e se ainda estivéssemos com um dinheirinho da mesada sobrando, a nossa turma composta por Humbertão(Humberto Carlos Campos Neto), Nino(Clóvis Pereira Junior),Quiquide (Euclides de Souza), raras vezes Gloriano, juntamente comigo, íamos aprender as dançar no Rumba Dancing, que era uma casa noturna, situada à Rua do Tesouro, paralela à Rua Chile. Alí chegávamos às 22 horas e só saíamos no cisco, às 4 horas da matina.  As garotas vindas do Rio de Janeiro e de São Paulo, eram exclusividade daquela Casa e nos ensinavam todos os passos  dos mais variados ritmos.  A noitada funcionava do seguinte modo: ao chegar, subíamos uma escada com mais de trinta degraus e lá no alto havia uma bilheteria, onde comprávamos o ingresso e recebíamos um cartão anexo, que só servia para o uso, nas danças que a pessoa fizesse parte. Dentro do salão, ao fundo havia um local onde um conjunto musical , executava músicas as mais variadas possíveis, durante toda a noite, sem haver nenhum intervalo. É claro, que os músicos se revezavam, nos seu descanso momentâneo. Nas partes laterais do salão, ficavam as mesas, onde se alojavam os homens que ali foram para dançar. Os garçons serviam bebidas e comidas que eram anotadas no seu talão próprio. No centro do salão, ficavam dispostas inúmeras cadeiras, formando um quadrado, com quatro aberturas para dar passagem de ida e volta. As garotas ficavam sentadas esperando quem fosse tirá-las para dançar e guardavam numa pequena bolsa, uma máquina, que perfurava o cartão do parceiro, assim que ele desejasse terminar aquela parte da dança. Ao final da noite, ou seja às quatro horas da madrugada , o conjunto parava de tocar e cada qual ia até o guiché, a fim de pagar a sua conta com os cartões perfurados.
Com a frequência quase constante de nossa parte, aos  poucos fomos ficando conhecidos das garotas e com elas travamos  uma boa amizade, ao ponto de em certas ocasiões, termos um reduzido número de furos em nossos cartões. Não sei ao todo, quantas vezes frequentamos aquele ambiente, por demais sadio. Vou citar, entretanto, dois casos completamente diferentes e que saíram da normalidade.
Naquela noite, o porteiro não foi com a cara de Quiquide e barrou o mesmo, logo na portaria. Decorrida uma meia hora de festa, eis que surgem vários homens de ternos completos, incluídas as próprias gravatas. Sentaram-se numa mesas especialmente reservada para eles.
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Minutos depois, Humbertão, descobriu que um deles, era Presidente do Galícia Esporte Clube, que era uma equipe de futebol, que disputava o Campeonato Baiano de Profissionais. E aí não deu outra. Começamos em coro a cantar o hino oficial do Galícia e dar vivas de parabéns ao Presidente, pela passagem do seu aniversário natalício. Nos momentos que se seguiram, os garçons começaram a trazer garrafas e mais garrafas de cervejas e refrigerantes, acompanhados de pratos de salgadinhos, tornando-se para todos nós uma farra, tão exuberante, que nunca haveríamos de esquecer em tempo algum de nossas vidas. Para completar, tenho a impressão, que as dançarinas foram instruídas a não cobrar pelas danças a que nos propusemos durante o resto da noitada. Como sempre acontecia, saímos do Rumba Dancing na hora em que a orquestra terminou de executar o último número e o que vimos ao descer a escada. O coitado do Quiquide, sentadinho num dos degraus, encostado na parede, cochilando, a nos esperar. Fora barrado na entrada e o jeito foi levá-lo para o pensionato.
Numa outra oportunidade, a festinha estava bem animada, quando lá pelas duas horas da madrugada, um grupo de rapazes, não muito próximo à nossa mesa, começou uma discussão em tons bastante altos, num xingamento, com palavras bem ofensivas entre eles. Em seguida, partiram para agressão, com socos e pontapés, e aí foram derrubando as mesas com copos, garrafas, pratos, num  QUEBRA-QUEBRA  infernal. Daí, a confusão começou a se generalizar, onde garçons correram em direção ao local, para evitar um tumulto maior. As moças gritando, e saindo do salão às pressas. Dirigentes do Rumba Dancing, apareceram no intuito de apartar a briga, evitando também. que devido a gritaria, pudesse despertar a chegada da polícia. Quando então sentimos, que a generalização da briga chegasse até nós, de comum acordo, nos levantamos e saímos do salão correndo, galgando quase num pulo só, a portaria que dava acesso a grande escada, que nos levaria à porta da rua. O CORRE-CORRE foi tão intenso, que só demos conta de pararmos já chegando ao final da Rua Ruy Barbosa, bem perto da Praça Castro Alves. Apesar do susto e da corrida inesperada, no final das contas só tivemos lucro, pois exceto o ingresso, no restante, não gastamos um centavo. Bebidas, comidas, cartões perfurados, nada nos custaram, pois devido a confusão, quem pode escapar daquela briga, ileso, como nós, até hoje, deve ter guardado  na lembrança.  

QUEBRA-QUEBRA: Desordem entre pessoas em que há depredações.

CORRE-CORRE: Correria. Correria desordenada. Tumulto.


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Chegamos ao final do ano letivo de 1953.
Na Faculdade, o dinheiro arrecadado com a rifa do automóvel foi distribuído proporcionalmente à vendagem que cada aluno fez. Como dos 74  alunos ,somente dez foram aprovados em primeira época, combinou-se que a maioria iria se formar em fins de janeiro, logo após os exames de segunda época, que seriam antecipados. Nós, que estávamos completamente livres de qualquer compromisso com a Faculdade, poderíamos escolher, de comum acordo com a Secretaria da Faculdade, o dia da nossa formatura, sem solenidades. Em meados de dezembro, Mamãe chegou a Salvador e foi logo mencionando que Papai não iria comparecer, mas gostaria de comprar o meu anel.
---Seu Dy, vou lhe dar o anel de sua formatura. Você escolhe o tipo e manda gravar o seu nome e a data da formatura.
---A data ainda não sei, mas ouvi dizer que será antes do Natal.
Noélia por sua vez, sem eu saber, pediu dinheiro ao pai dela e me ofereceu uma caneta Parker 51, de tampa dourada (muito em moda na época), mas ficou também no mesmo dilema de Mamãe. Qual a data que seria posta no corpo da caneta?
Com aquele zum zum zum, que sempre precede a escolha da data da formatura, soube, entre os colegas que iriam se formar comigo, que a data mais provável seria, de  uns dois a três dias antes do Natal e assim,   por mim mesmo ,tomei a resolução e mandei gravar meu nome por extenso e a data de 23 de dezembro de 1953.
Como sempre a mesada que Papai enviava era muito curta e sempre arriscava uns palpites no “jogo do bicho”. Às vezes acertava nas dezenas, porém mais AMIÚDE, ganhava nos “grupos”. Na mesma ocasião, tia Edite mandou consertar as duas escadas que ligavam o primeiro ao segundo andar. Era um poeirão medonho e ficávamos com pena de vovô Manta, que com aquela asma renitente, passava maus bocados.
Finalmente o Secretário da Faculdade, colocou o aviso no quadro, informando  que a data da nossa formatura, seria no dia 23 de dezembro, pela manhã, com início às dez horas, Mamãe, tia Edite e eu, fomos até lá e chegada a minha hora, recebi um canudo de cartolina amarrado com uma fitinha fina verde amarelo. Enquanto os outros nove colegas recebiam os seus canudos, tive a curiosidade de olhar a parte interna e vislumbrei que o papel estava totalmente em branco. Era um diploma só  figurado.
Em casa, a comemoração se resumiu a uns bolinhos, com refrigerante da Fratelli Vita.
Dois dias após o Natal , logo pela manhã, quando acordei e comecei as descer as escadas, vi e ouvi os trabalhadores conversando sobre o resultado da Loteria Federal, onde um conhecido deles, havia ganho um boa “bolada”no jogo do bicho.  Apenas , por curiosidade, perguntei qual fora o milhar sorteado no primeiro prêmio. Eles me responderam, que só sabiam do resultado do milhar que fora 1923 e que um conhecido deles havia ganho um bom dinheiro.

AMIÚDE : Repetidas vezes. Frequentemente.

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Não quero me referir ao milhar 1923, mas a dezena, 23 não me saiu da cabeça por muito tempo e até hoje, reparem, ela está presente nos meus escritos. Porque então aquela dezena, ficou assim tão perturbadora? Ora vejam bem: primeiramente escolhi uma data ao acaso, pois sendo antes do dia de Natal 25, mandei gravar o meu nome completo: Irundy Manta Alves Dias e a data que eu escolhi: 23/12/1953, no corpo da caneta Parker e no aro interno do anel de formatura. Em segundo lugar, a minha idade também era 23 anos e para completar, a Secretaria da Faculdade, escolheu justamente o dia 23 para a na nossa formatura sem solenidades. Quando os operários que trabalhavam nas escadas da casa de tia Edite, comentaram sobre o milhar 1923, por esquecimento ou por não ter tido tempo, deixei da ganhar no jogo do bicho, algum dinheiro, com a dita dezena 23.
Antes de regressar a Poções, fui a uma casa comercial, que vendia material odontológico e como também já era conhecido do pessoal, desde o tempo que passei , trabalhando no  Posto Maçônico, as coisas ficaram mais fáceis para mim. Apresentei uma lista de ferramentas, utensílios e medicamentos, para pagar somente depois de quatro meses, sem ter dado entrada de nenhum centavo.
Como Noélia, já estava aqui em Poções, estive com ela, agradecendo primeiramente da caneta que ela me oferecera e nos organizamos a frequentar a festa de Réveillon que se aproximava.
E de fato, quando o dia 31 de dezembro de 1953, chegou finalmente, suspirei aliviado, pois uma etapa de minha estava concluída. Era pensar positivo, para encarar de perto. a vida profissional que se avizinhava e mais ainda, pelo compromisso que mentalmente já encarava na vida de Nó.
Quem apareceu na festa para  a minha surpresa, foi uma irmã de Noélia, por nome Tereza. Parece-me que naquela noite, toda a família resolveu frequentar o Clube Social. Tavinho com a sua esposa Amélia, levaram Jurimar, outra irmã de Nó, que estava de namoricos com o seu primo Vecinho (Elvécio Nápoli), a própria Tereza já citada e a minha querida Nó. Paguei o meu ingresso, sem precisar mais de apresentações, pois já estava sendo conhecido da Diretoria. A festa por sinal, foi muito boa e daquela vez não houve, marcações quando dançávamos o pessoal saiu da festa, quase as quatro horas da manhã. Foi uma noitada muito divertida e aproveitamos muito, como um prêmio pela minha formatura.
Na matinê do dia primeiro de janeiro de 1954, estava mais leve. Não havia mais aquele compromisso em viajar a Salvador, para frequentar as escolas, que desde o tempo de menino me atazanaram o juízo, com aqueles altos e baixos, citados às vezes, com muitos pormenores. A situação agora era outra. O trabalho viria pela frente, mal sabendo eu , do abacaxi que me esperava para certos momentos. Para começar a trabalhar na profissão, Papai adquiriu em mãos de Dr. Plínio, uma cadeira usada do seu gabinete dentário, enquanto ele comprou uma outra, com mais detalhes técnicos e mais aperfeiçoada. Mas, aquilo nunca me desabonou, pois simples como fui em toda a minha  vida , iniciei os atendimentos numa sala da frente da casa, cujas janelas ficavam voltadas para os fundos da parede da Igreja.

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 Para quem estava trabalhando nos serviços odontológicos, nada me desabonou. A dificuldade que senti inicialmente, foi no uso do motor a pedal, pois em Salvador na Faculdade, com energia elétrica direta ,era uma mudança bem radical. Poções, infelizmente, naquela altura dos acontecimentos, não dispunha de energia elétrica durante o dia. Durante as noites, éramos servidos somente das 18 as 24 horas, através de um motor de propriedade do Sr. Braz Labanca, que na maior parte das vezes, deixava a cidade às escuras, com aquelas quebras que sempre aconteciam e que atazanavam o juízo do Sr. Nicola Leto, funcionário do serviço.
À medida que os dias se passavam, Noélia e eu, estávamos pensando na primeira separação por longo tempo, pois ela teria que voltar a Salvador, para concluir o seu curso ginasial. Não sei  se enjoada com a vida escolar de interna nas Mercês, matriculou-se no Colégio Ipiranga, situado  na Rua do Sodré e ficou hospedada num pensionato de uma italianas no largo da Mouraria, próximo a um quartel do Exército. Não precisaria tomar transporte, devido à proximidade do pensionato ao Colégio. Finalmente o dia do seu retorno chegou e ficou aquela sensação de vazio, algo que nunca havia acontecido comigo.
Continuei a atender os meus primeiros clientes, na maior parte, em extrações dentárias e raras restaurações, porque também, a maioria do pessoal proveniente das roças, não acreditava nelas dizendo que em pouco tempo, as restaurações se desprendiam dos dentes. Entretanto, três meses depois, começaram a surgir os clientes para colocar trabalhos protéticos, em sua maioria dentaduras totais. Eram clientes das roças, que haviam feito contratos, para remoção de todas as unidades dentárias, para posterior colocação das referidas dentaduras. Aí, a coisa começou a ficar braba.  Reparem-se só: os clientes chegavam na sexta feira pela manhã, para efetuar a primeira moldagem e queriam as dentaduras prontas até o final da tarde de domingo, porque precisariam voltar às suas residências. Foi uma luta INSANA. Quando o trabalho aumentava, cheguei a dormir muitas vezes, altas horas da madrugada, com o Alladim aceso, a fim de dar conta dos serviços que apareciam.
Uma mania que o povo da roça adquiriu, era o de mandar colocar  pequenas incrustações em ouro , nos interstícios dos dentes postiços das dentaduras. Aquilo, ainda dificultava mais o serviço, embora aumentasse o preço do trabalho protético.
Vale ressaltar naquele período, a figura  PRESTIMOSA de Deusdete Fagundes, que conheci anos atrás e que possuía uma boa prática na confecção dos trabalhos protéticos.Com o auxílio dele, avançamos mais no serviço, porque afinal, eram quatro mãos a desempenhar o papel de duas. Numa determinada sexta feira, eis que surgem em nosso gabinete dentário, dois casais, não residentes em fazendas próximas daqui de Poções e que também não tinham sido meus clientes, desejando colocar sete dentaduras totais, com as célebres incrustações em ouro. Como sempre acontecia, queriam voltar no domingo logo depois do almoço, pois moravam longe e desejavam chegar nas suas roças,  ainda com o dia claro.

INSANA : difícil de fazer, de suportar ou de realizar.(Diz-se do esforço no trabalho).

PRESTIMOSA: aquele ou aquela que gosta de ajudar. Prestativo(a).
 
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Pedi a Mamãe que ficasse conversando com o pessoal, enquanto eu fui a trás de Deusdete a fim de relatar o caso. Ao explicar a situação, Deusdete ponderou os altos e baixos daquela empreitada e me disse com a calma que lhe era peculiar:
---Sete dentaduras, com incrustações a ouro e com dinheiro à vista, não aparecem todo dia e vão nos render um bom dinheiro.
Já retornamos juntos e ao chegar em casa, Mamãe mandara fazer café e o pessoal estava à vontade. Aí, é que foi trabalho duro. Fizemos a primeira moldagem e a tarde partimos para a moldagem definitiva. (Vale salientar também, que os materiais de moldagem daquela época, às vezes vinham com defeito de fabricação). Mas felizmente, o nosso serviço andou rápido, sem nenhum constrangimento. Para encurtar a história, no domingo às três e pouco da tarde, colocamos as dentaduras e todos se mostraram satisfeitos, principalmente as duas madames, que ficaram alguns minutos com os espelhos, reparando o com minucias, todos os detalhes.
O fato é que com parte do dinheiro fui a Salvador saldar uma dívida, que fizera na casa de artigos odontológicos e para surpresa de Nó, fui esperá-la no pensionato, que ficava ´perto do Colégio Central( ex Colégio da Bahia).
Com poucas palavras, Noélia explicou-me, que uma das freiras, apelidada pelas alunas de Irmã cintura fina, era muito observadora e ficava de marcação, todas as vezes, que as meninas recebiam visitas. Assim para evitar problemas, pediu transferência para o Colégio Ipiranga, que no caso, era muito mais próximo do pensionato.
Estávamos percorrendo os primeiros dias de junho e aproveitamos muito bem o final de semana. Sem que ela soubesse e também, nada comentei à respeito, comprei um par de alianças, que guardei comigo vários meses, até que tivesse a oportunidade de pedi-la em casamento.
Voltei a Poções e poucos dias depois, iniciou-se uma nova Copa do Mundo, desta vez sendo realizada na Suiça. Pelas  notícias veiculadas pelos jornais e rádios, a equipe favoritíssima era a da Hungria, que pelos trinos realizados, estava arrasando os adversários. Por sua vez ,a seleção brasileira estava disposta a se REDIMIR, daquele fracasso da Copa de 50, sendo derrotado pelo Uruguai no jogo final , por 2 a1. Com a realização dos primeiros jogos, Hungria e Alemanha que faziam parte do mesmo grupo, classificaram-se facilmente às quartas de final. O interessante é que no confronto entre ambos, a Alemanha colocou em campo o sei time reserva e perdeu de 8 a 3 para a equipe da Hungria, que não estava respeitando ninguém. Enquanto isso, o Brasil também conseguiu passar às quartas de final e por azar pegou logo pela frente a Hungria. Como não tínhamos ainda em Poções, energia elétrica durante o dia, Tavinho, comprou um rádio novinho, movido à bateria de automóvel e convidou-me para acompanhar com ele, os jogos da Copa. O sinal vindo da Europa, não era dos melhores.
REDIMIR: o mesmo que remir . Resgatar.

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Ás vezes, o som era bem audível, mas na maioria do tempo, precisávamos encostar os ouvidos junto ao rádio, para tentar perceber o         que estava sendo transmitido. Quando conseguimos ouvir direito em certo momento, o time da Hungria em menos de cinco minutos, já fizera dois gols no Brasil. Aos poucos, a equipe brasileira chegou até  a equilibrar a partida mas, ao final dos noventa minutos, perdemos por quatro a dois e fomos eliminados da Copa. O Uruguai, que trouxera quase os mesmo jogadores da Copa de 50, conseguiu chegar às semifinais e aí pegou também a Hungria pela frente. Outro placar de quatro a dois para os húngaros.
Naquela altura do campeonato, Nó já havia chegado para as férias do meio do ano e como nunca gostou de futebol, só aparecia para perguntar, quem estava ganhando. Durante os nossos encontros, dizia a ela como estava me saindo na profissão, mas na época, havia aqui em Poções, um colega tão usurário, que parecia querer abraçar a “Deus e o Mundo.” Na minha simplicidade de sempre, ia tocando o barco vagarosamente, mas devido o amor que nutria aos meus pais e à minha querida Nó, dei ouvidos de mercador, aquele antipático colega e fuio me mantendo aqui em Poções.
Dias depois, houve o jogo final da Copa de 1954 e quando todos esperavam a vitória da Hungria, eis que a Alemanha venceu por três a dois e sagrou-se campeã do mundo pela primeira vez.
Nó retornou a Salvador e fiquei mais uma vez amargando a nossa separação.
A política estava chegando ao auge contra Getúlio Vargas, então Presidente da República do Brasil. Quando eu acordei no dia 24 de agosto, Mamãe deu-me a notícia do suicídio dele, deixando uma carta, que ficou seguidamente lida pelas estações de rádio. Foi um dia tremendamente triste para toda a Nação brasileira. Depois do café matinal, fui à rua e o comércio em solidariedade à morte do Presidente, manteve-se com as portas cerradas durante três dias. Somente à tardinha, é que as padarias abriam uma meia porta para atender a  freguesia. As conversas nas ruas,  só giravam em torno daquele mesmo assunto, uns comentando que Getúlio fora um covarde em suicidar-se, já outros defendiam o ponto de vista de que ele fez um gesto de coragem. Cheguei até em pensar em minha tia Iaiá, irmã de Papai, que sempre fora ardente fã de D.Pedro II e de Getúlio Vargas.
Mas o trauma foi dando lugar às eleições municipais e Poções começou a movimentar-se através dos seus três Partidos políticos: o Republicano que não tendo candidato próprio, preferiu apoiar o candidato da União Democrática Nacional,(UDN),na pessoa do Dr. Aloysio Euthálio da Rocha e o Partido Social Democrático,(PSD), que apresentou o nome do Sr. João Gusmão Ferraz(Jambinho), pai de Noélia. Foi uma política muito suja. Eu que não estava acostumado a ver e ouvir tantos disparates, tantas acusações sem procedência, tanta sujeira, que acontecia principalmente através do serviço de alto falantes e pelos folhetos, que eram distribuídos à população, fiquei enojado. Nunca mais, Poções se curvou a tanta idiotice e tantos disparates dados de parte a parte. Embora tenham se passado quase 60 anos, quem viveu aquela época, deve estar recordando aquele mal estar causando á família poçõense pedindo a Deus para não acontecer nunca mais.
                                                              
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Até o papagaio que as meninas criavam, de tanto ouvir os dizeres do pessoal, gritava a toda hora, alto e em bom som:
“--- já ganhou !  já ganhou  !  já ganhou  !
Realizada a apuração dos votos, soube por pessoas que sempre acompanhavam o desenrolar das eleições, que houve fraude e acabou o Sr. Jambinho perdendo por 99 votos de diferença.
Passada aquela eleição, à partir das próximas, sempre fui convocado, para participar como mesário algumas vezes e mais adiante, talvez já tarimbado com o serviço eleitoral, fui guindado ao posto de Presidente da mesa. Mais tarde, fui chamado a fazer parte da mesa escrutinadora e ali, cheguei a ver  de perto, como alguns mesários adulteravam as cédulas. Guardei comigo aquele silêncio, porque não pretendia dedurar ninguém. Entretanto, quando finalmente fui ocupar o cargo de Presidente da Mesa escrutinadora, aquela moleza de outras apurações, acabou, pois eu tinha o trabalho de conferir voto por voto  e em seguida carimbava e rubricava.  Outra maneira de adulterar o resultado da votação era na hora de transportar a quantidade de votos de cada urna, para os mapas próprios de apuração. Fiquei revoltado com aquilo tudo que presenciei ao longo de vários anos. Eu, que sempre fui  apolítico, vendo aquela SEM-VERGONHICE total, abstive-me de comentar com meu pai, minha mãe e meus familiares.
Noélia já sabia do resultado da derrota que impingiram ao pai dela nas urnas e ao vê-la em novembro ela chorou muito. Mas aos poucos consegui acalmá-la e a fim de dar-lhe uma notícia mais agradável, mostrei-lhe um par de alianças, que havia comprado em Salvador e que até então mantivera sigilo absoluto. Prometi também que em 1955, iria pedir ao Sr. Jambinho o consentimento para que nós ficássemos noivos.
Antigamente Salvador ainda não possuía terminal rodoviário e a empresa pela qual viajávamos, utilizava a Ladeira de São Bento como o local propício para a chegada e saída dos seus veículos. A bagagem dos passageiros era colocada em  cima do teto do ônibus, coberta com uma lona e amarrada com cordas bem grossas, para que não despencassem lá de cima, devido o sacolejo do ônibus durante a viagem. Saíamos da Salvador entre cinco e cinco e meia da manhã,  com a primeira parada obrigatória em Feira de Santana,  em frente a uma lanchonete, que não oferecia aos passageiros, o mínimo de conforto ou de higiene. Basta dizer que nem sanitário tinha. Saliente-se também, que os próprios ônibus não dispunham de toalete à bordo. Numa certa viagem, naquele mesmo local, eu estava apertadíssimo para urinar e sabedor do desconforto, pelo qual passávamos, desci do ônibus, atravessei toda a extensão da lanchonete e sem que ninguém estivesse me observando, fui lá nos fundos e urinei tranquilamente  sobre umas caixas vazias de cerveja. Quando você compara os ônibus de hoje, com aquelas carroças dos anos 50, sente às vezes, que não desejaria ter nascido naquela época.

SEM- VERGONHICE: falta de vergonha, de pudor. Indecência. Ato ou procedimento de quem é sem-vergonha.

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Depois da parada de Feira de Santana, havia uma segunda, em frente a um bar, próximo a Santo Estevão. Naquele local, ninguém descia e também ninguém subia. Pergunta-se então: ---Porque aquela parada ali?. Mais adiante outras duas paradas em postos de combustível, com um restaurante ao lado, com os nomes sugestivos de Maracanã e Pacaembu, possivelmente em homenagem aos estádios de futebol do Rio de Janeiro  e de São Paulo. Será que os motoristas dos ônibus ganhavam alguma gorjeta para fazer aquelas paradas naqueles locais? Chegando em Milagres, quase ao meio dia , se a viagem estivesse indo normal, lá no alto da serra , havia uma pensão onde  a parada era obrigatória, tanto para quem ia ao interior, como para quem estivesse voltando a Salvador. Inferno acontecia quando por acaso os dois ônibus chegavam quase no mesmo horário. Era tanta gente com fome. Uns indo aos sanitários, que no caso eram apenas dois cubículos, para atender cerca de sessenta a oitenta passageiros. Já outros, procuravam arranjar logo, seus lugares a fim de serem imediatamente servidos. Não havia ainda o esquema de selv-service. A disputa dos lugares era tremenda e algumas pessoas eram até mal servidas. Para ser franco, nunca sentei-me naquela pensão para almoçar. Hoje em dia, todas às vezes, que passo naquele local, olho de imediato para recordar o que foi no passado aquela pensão. Restam apenas as paredes frontais. O restante, o tempo e os incautos acabaram de destruir. Seguindo a viagem, íamos ter uma nova parada no chamado quilômetro l00. Recebeu esse nome algum dia, porque alguém achou que dali até Jequié eram exatamente 100 quilômetros de distância. Mais adiante, uma nova parada no entroncamento que leva à Cidade de Jaguaquara. Por vezes, subiam alguns passageiros com destino a Jequié, que seria a nova parada obrigatória. Ali é que sempre foi uma provocação a todos os Santos. Para promover a cidade, a Prefeitura local  mandou construir o terminal rodoviário no próprio perímetro urbano, onde o ônibus passa vagarosamente por ruas estreitas, com perigo até de atropelamento. E a espera na continuação   da viagem, doía todos os ossos das pessoas que já estavam alí estafados depois de inúmeras paradas. Os motoristas, além do lanche, que às vezes eram jantares, nem se preocupavam com o tempo. Ficavam  conversando uns com os outros à vontade.
Naquela viagem, que foi de uma felicidade geral, pois não houve quebra de peças do ônibus, conseguimos chegar em Poções,  aí por volta da meia noite, naquela rua estreita, que algum dia, recebeu o nome de Travessa Lions Clube.
Alguns garotos, que sempre ficavam à espera dos ônibus, pegaram a nossa bagagem para ganhar alguns trocados. Sugeri a um deles que ficasse a minha espera com a minha maleta, pois iria levar Noélia até a residência  dela. Acompanhei-a de fato até a sua porta e só me retirei depois que a mesma foi aberta. Não sei , se para não incomodar o seu pessoal , Nó não avisou a ninguém da data de sua chegada. Despedi-me e voltei a agência onde o garoto estava a minha espera. Dali fomos para casa.

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