quarta-feira, 26 de junho de 2013

Autobiografia de Irundy Dias ( p 30 )

Era ideia dos alunos colocar uma espécie de barraca durante os Festejos do Divino Espírito Santo. Para fazer quermesses  com artigos doados pelas casas comerciais e assim conseguirem os primeiros cruzeirinhos para o Grêmio.
Quando as festas foram se aproximando, eu já estava bem entrosado com os alunos, mas o Diretor José Carlos, não se manifestava com intenção e ajuda-los ou de ter alguma aproximação com os mesmos. E assim o tempo passou. Eles me tomaram como o conselheiro ideal  e eu sabia como orienta-los.
Desse modo, uma semana antes do inicio do novenário, idealizamos colocar uma barraca coberta com lona de caminhão na parte superior e nos fundos. As partes laterais e a da frente, ficariam abertas apara atendimento aos fregueses. Como também, eu respondia pela tesouraria do Clube Social, foi fácil solicitar três mesas emprestadas, para colocarmos dentro da barraca. As mesas ficaram cobertas com toalhas e em cima delas, ficaram os objetos arrecadados como empréstimo.

Abrimos então, três frentes de trabalho: a primeira seria a de vender qualquer objeto diretamente ao fregueses que gostassem de qualquer mercadoria; a segunda que através de bilhetes numerados, as estudantes sairiam pela praça vendendo bilhetes em pequena quantidade, para que pudessem efetuar o maior numero de sorteios possíveis. A última frente de trabalho seria a de anotar num caderninho, os recados de namorados ou outras mensagens que surgissem , que seriam transmitidas pelo serviço de alto falantes do parque de diversões, que na época, era armado em plena praça da festa. E não é que essa última rendeu um bom dinheirinho. Apareceram mensagens de namorados marcando encontro, convites de aniversário, de noivados, de casamento, de batizados, enfim um serviço de comunicação que estava mesmo a necessitar.
Assim, apurou-se uma boa renda e a garotada ficou bastante animada, prometendo repetir o feito no ano vindouro. Os trabalhos foram encerrados no sábado, porque no domingo, que é o encerramento da Festa do Divino, nós teríamos que devolver as mesas, pois o Clube Social sempre promovia uma festa dançante para os sócios e seus convidados. (Até isso o tempo se encarregou de modificar. Hoje em dia a festa é encerrada no próprio largo, com as ultimas bandas que foram contratadas).
Quando chegaram os festejos em louvor a São João, armei a minha primeira fogueira. Confeccionei  uma dezena de balões, que aprendi a fazer, quando era criança, observando todos os detalhes que o meu avô Manta executava. Aquela foi a primeira fogueira, repito, e dali para cá, nunca mais deixei de armar uma fogueira, e cada ano que passa aparecem novos detalhes. Somente os balões não foram mais feitos, devido o perigo que que o mesmo pode causar, queimando ou incendiando um outro local.
A nossa primeira festa  naquela noite junina, chamou a atenção dos meus vizinhos Érico e sua esposa, pois no Rio Grande do Sul, onde residiam, não havia aquele tipo de comemoração.


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Um pouco mais tarde, Amélia, Jurimar e Tereza, irmãs de Noélia, foram nos fazer companhia, enquanto Tavinho fora visitar os pais.
Aquela minha fogueira, tornou-se uma tradição e religiosamente nesses anos todos que estamos casados, nunca, mas nunca mesmo, deixamos passar os festejos de São João, sem queima-la. Foi uma pena proibirem a soltura de balões. Eram lindos de se ver, subindo silenciosamente, numa  noite estrelada e principalmente se tínhamos também a presença da lua.
Chegamos finalmente a uma data que nunca foi esquecida. 17 de julho!

Aniversário do Sr. Jambinho e nesse ano de 1960, tudo foi feito em caráter dobrado, pois a festa em si, foi para celebrar o casamento de sua filha Jurimar, com o funcionário do DNOCS, Hélio Pinto Vieira, já mencionado em linhas atrás.   

Foram praticamente dois dias de festa, pois o casamento oficial foi realizado na tarde do dia 17 e dai em diante, os convidados e amigos do Sr. Jambinho, foram se revezando dia e noite.
Como Prefeito de Planalto, “seu Jambinho “, atraiu mais gente ainda, pois apareciam para comemorar o seu aniversário e quando lá chegavam ao saberem do casamento da filha dele, perdiam mais um tempinho, porque perder ali mais umas horas, comendo e bebendo gratuitamente, não faziam mal a ninguém.
Enquanto isso, a barriguinha de Nó estava adorável. Redonda e bonitinha. Pudera! Setembro estava bem próximo.
Como o casamento foi realizado na fazenda, nós fizemos um cálculo assim pelo alto, que as despesas entre o casamento de Amélia e o nosso, custaram bem menos que o de Jurimar. Basta comentar que Dona Lera, a mulher que vivia com o Sr Jambinho, assim q          ue ele ficou viúvo, nos disse reservadamente:
---Jambinho mandou matar dois bois, quatro porcos e uma grande quantidade de patos e galinhas  de se perder a conta. Vocês sabem como ele é. Detesta passar vergonha. Quem veio até aqui, tem que beber e comer até não aguentar mais.
Seu Jambinho era assim mesmo, como Lera declinou.
Noélia de vez em quando, ao rememorar os tempos de criança, comenta conosco:
---Dy, meu pai era exagerado. Quando morávamos em Serra Preta, tínhamos uma sala reservada para colocar os mantimentos. Em cada canto ficavam amontoados centenas de laranjas , de limas, caixas de bacalhau da Noruega, outras com barras de chocolate, enfim uma enorme quantidade de mantimentos. Ah que tempo bom. Muita fartura e também muito exagero de meu pai .

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Com uma pontinha de inveja, às vezes eu também comento, para que todos ouçam:
---Em minha companhia também, viajamos muito. Já conhecemos Fortaleza( não somente porque depois de casada, Jurimar passou a residir naquela capital),Mossoró, Natal, Olinda , Porto de Galinhas, Muro Alto, Recife, Maceió , Barra de São Miguel, Aracaju, Deodoro, Vitória, Cachoeiro de Itapemirim, Brasília, Goiânia, Belo Horizonte, Ouro Preto, Mariana, São João Del Rei, Tiradentes, Três Corações, São Lourenço, Águas de Lindóia, Caxambu, Poços de Caldas,Aparecida, São José do Rio Preto, São José dos Campos, Monte Sião, São Paulo(capital),Águas de São Pedro, Campos do Jordão, Serra Negra,  Londrina, Maringá, Curitiba, Foz do Iguaçu, Cascavel, Blumenau, Joinville, Florianópolis, Porto Alegre, Garibaldi, Bento  Gonçalves, Caxias, Gramado, Canela, Camboriú e outras cidades de menor porte ,  que encheriam essa  e outras páginas.
---Dona Nó, todas as vezes que nós vamos a Morrinhos, tem o orgulho de dizer, ao tempo que vais mostrando as casas de uma única rua que tem no Povoado:
“---Alí a direita residiu a madrinha Nenza, mãe de Irene Lamego.  Mais adiante, o tio Jú...
E aí vai citando, um a um dos seus parentes, numa recordação inequívoca do seu bom tempo de criança. E por falarmos em Morrinhos, acho um local agradável e pacato e que o próprio tempo se incumbiu de conserva-lo intato. Seu padroeiro é Santo Antônio, pelo qual nutro uma imensa dedicação, onde desde os tempos de criança, acompanhava horas e horas, Vovô Manta, em suas rezas na trezena de primeiro a treze de junho. Há uma imagem de Santo Antônio, em nossa casa, que provavelmente deve ter sido esculpida há mais de cento e cinquenta anos, visto que , ela foi trazida de Portugal,  pelo pai de vovô Manta. Ao morrer, o pai dele já havia dado a peça a vovô Manta que se encarregou de continuar a devoção ao Santo Padroeiro. À medida que os anos se passaram, essa estátua passou às mãos de Mamãe por morte de vovô Manta. Anos e anos Mamãe continuou também, dedicando a sua reza em louvor a Santo Antônio. Quando houve o falecimento de minha mãe em 1997, essa peça passou às minhas mãos.





Setembro de 1960 chegou!
Numa bela noite estrelada de 26, estávamos Noélia e eu, jantando calmamente, enquanto Maria Sybele dormia profundamente no quarto da frente da casa. Repentinamente, Nó deu uma parada durante o jantar e me disse sem muito estardalhaço:
---Dy, senti uma pontada cá em baixo da barriga!
Parei a colher de sopa a meia altura e depositei-a novamente no prato ao tempo em que avisei:
---Nó, se você sentir de novo essa pontada me fale. Será que o neném irá nascer hoje?
Continuamos jantando, embora um pouco apreensivos. Mas à medida que os minutos foram passando, as pontadas começaram a perturbar o ânimo de Noélia.
---Sabe de uma coisa--- falei para Nó ---vou avisar primeiramente a Amélia e em seguida irei procurar o Dr. Aloysio.
Dito e feito. Peguei a bicicleta e saí em disparada pela ladeira da Avenida Cônego Pithon. Avisei a Amélia e fui procurar Dr. Aloysio, encontrando-o jogando “BURACO” com uns amigos na residência de Liligo (Eliomar Morais). Na minha chegada inesperada, momentaneamente o jogo foi interrompido e dei o recado. Observei, entretanto, que os parceiros quando jogam o buraco não gostam de ser interrompidos e por isso mesmo, ainda fiquei esperando por alguns minutos, até que Dr. Aloysio saiu comigo e fomos juntos ao seu consultório, onde ele pegou o seu material necessário. Foi uma espera demorada e aborrecida. Mas cada parto tem a sua característica. Quando finalmente chegamos. Amélia já havia tomado a providência de levar Sybele a outro quarto e estava ali ao lado de Noélia, que deitada, aguardava a nossa chegada. Foi tudo muito rápido e totalmente diferente do parto de Sybele. Enquanto esta demorou bastante para nascer e o fez com o rosto voltado para cima, Mercês em pouco mais de duas horas, desde o tempo que eu saí, nasceu sem dar trabalho nenhum, com o rostinho voltado para baixo, vendo a cabecinha com aquela penugem de cabelos pretos.
‘’BURACO” :jogo de cartas semelhante à canastra, que usa dois baralhos  completos, mais dois coringões e pode ser jogado com ou sem parcerias.

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E assim com dois anos de casados, já estávamos com a segunda filha e mais uma vez, o nosso amigo Bernardo Messias, errou nos seus cálculos, pois uns dias antes ele me dissera:
---Irundy,  dessa vez eu não vou errar. Noélia irá ter um meninão.
A população recebera uma notícia auspiciosa. Iriam mudar os motores que geravam a energia elétrica para a Cidade e esse trabalho perduraria entre quinze a vinte dias.
“---Só esse pouco tempo!” --- exclamei eufórico para Noélia. ---“Para uma população que há pouco tempo atrás ficara, dois anos seguidos sem ter um mínimo de consideração, quanto a energia elétrica em suas residências, aquilo, era mesmo uma dádiva de Deus”.
Para não ficarmos sem fazer nada, naquelas noites que viriam, convidamos dois amigos nossos: Carlos Jorge Tavares Tôrres e Benevaldo Rocha para realizarmos um campeonato de “buraco”, embora Noélia não entendesse nada do assunto. Para isso, tivemos que perder duas noites ensinando o jogo a ela, como também alguns truques, que certos jogadores fazem no decorrer das partidas. Quando tudo ficou arrumado, fizemos um sorteio das duplas e combinamos que cada noite iríamos fazer uma troca entre os parceiros, mas anotando numa caderneta, os pontos individuais. Noélia montou um esquema que satisfez a todos, pois  Sybele que era a maiorzinha, tomava a sua mamadeira e continuava a dormir, enquanto Mercês se reabastecia mamando os seios dela.  Para não ficarmos parados, fazíamos a nossa merendinha, entre as vinte e uma  e vinte duas horas, aguardando Noélia acabar de colocar as duas pequerruchas nos respectivos berços. Dessa forma, fomos realizando o nosso campeonato, interrompendo-o somente nos sábados e domingos, para assistirmos filmes nos Cine Santo Antônio e Cine Glória, pois ambos dispunham de seus motores próprios. Quando soubemos da notícia da inauguração dos novos motores, marcamos o encerramento do nosso campeonato para dois dias antes. Para isso, fizemos a contagem dos pontos e verificamos que Carlito (Carlos Tôrres), fora o campeão. Noélia apesar de novata conseguiu o segundo lugar. Benevaldo galgou o terceiro posto e eu fiquei na “LANTERNA” do campeonato. Marcamos então a noite da festa de congraçamento, onde Noélia previamente com todo o esmero possível, preparou uma merenda SUPIMPA. Aí, naquela noite, Carlito apareceu na porta lá de casa, com uma faixa sobre a camisa e outra numa das mãos. Na dele, via-se escrito em letra garrafais as palavras: Campeão Ocótico, enquanto na de Noélia estava: Vice campeã Ocótica. Nem ele soube dizer o que significava aquela palavra Ocótico e nunca descobri em dicionário nenhum o significado da mesma. Foi uma festança entre nós quatro e depois de passados todos esses anos, fico relembrando e memorizando comigo mesmo: Cada pessoa tem que aproveitar o seu momento de felicidade, que poderá vir sem avisar o ano, o mês, o dia e a hora. Aquela foi uma noite feliz para nós quatro. É uma pena BENÉ, é uma pena CARLITO, que vocês não estejam aqui conosco, para relembrar aquelas noites que passamos juntos, desfrutando de uma amizade sadia e pura .

LANTERNA : Gíria esportiva dedicada ao último colocado em qualquer tipo de competição.

SUPÍMPA : ótimo . Excelente.


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Fiquem com Deus!  Nó e eu estaremos aguardando a nossa chamada e enquanto não chega a nossa vez, estamos escrevendo esse blog, mostrando ao povo de nossa terra, que Felicidade, não precisa ser cercada de dinheiro. Felicidade é aquele tempo que você passa sozinho, ou em companhia de alguém, ou de alguns amigos.
 Lá no céu, BENEVALDO E CARLITO, tenham certeza de uma coisa:
           VOCÊS FORAM NOSSOS AMIGOS.
                     ATÉ BREVE!
                          QUE DEUS OS GUARDE EM SUA SANTA MORADA.














































































quarta-feira, 12 de junho de 2013

Autobiografia de Irundy Dias ( p 29 )

Minha cunhada Jurimar, que estava de namoricos com o seu primo Elvécio Nápoli (Vecinho), em comum acordo resolveram terminar aquele compromisso, devido a insistência de diversos parentes que alegaram que relações com primos, nunca deram certo. Então, dias depois, olhem Dona Jurimar já de namoro firme com um cearense, por nome Hélio Pinto Vieira, primo do Sr. Cesar Barrocas, onde ambos  ficaram encarregados de supervisionar as obras do açude de Morrinhos, que estava sendo construído pelo DNOCS (Departamento Nacional de Obras Contra as Secas).
Enquanto isso, durante os Festejos do Divino Espírito Santo, já em fins de maio, o Diretor do Ginásio de Poções, Dr. José Carlos Peixoto Pereira, recebeu um convite da direção do Colégio Florestal de Nova Canaã, para irmos até lá, no dia 7 de junho, um domingo, a fim de entrosarmos, os nossos alunos, professores e dirigentes, numa confraternização geral, onde teríamos a oportunidade de jogarmos uma partida de voleibol e duas provas de atletismo, como sendo salto em altura e salto em distância. O Dr. José Carlos, leu a carta em voz alta, em plena sala de aula, para que professores  e alunos ficassem cientes do convite que acabara de receber. Alegou porém, que por motivos particulares, ele próprio, declinava do convite, mas delegava  poderes aqueles que desejassem ir conhecer a cidade de Nova Canaã e os colegas da primeira série ginasial.
O domingo escolhido amanheceu com um sol radiante, embora aquele friozinho seco das noites de junho estivesse presente. Mas, em Canaã, zona da mata, imperava o calor e por isso mesmo, ninguém se atreveu a colocar nenhum agasalho. O Sr Prefeito Olímpio Lacerda Rolim, forneceu um motorista com o caminhão alugado para nos levar até aquela cidade e lá chegamos por volta das nove da manhã. A caravana ficou formada por dezenove pessoas, sendo dezesseis estudantes e três professores, estes que se apresentaram com boa vontade, desde quando nem o Diretor, nem os demais professores demonstraram interesse em participar do evento. O caminhão estacionou numa pracinha e por incrível que pareça, já nos esperavam, com bandeirolas e espocar de foguetes. Inúmeras crianças, misturadas entre alunos e outras da cidade, saltitavam e pulavam em cada lado do caminhão. Saltamos e solicitamos aos nossos alunos que descessem vagarosamente para que ninguém se machucasse. Os estudantes de Nova Canaã, eram em sua maioria, com mais idade e também maiores no tamanho. Enquanto a nossa média de idade variava entre 14 e 15, os de lá, acredito, ficavam numa faixa superior em anos. Fomos convidados a subir uma ladeira, pois o Colégio fora construído, lá no alto( não sei dizer, se hoje em dia, ainda continua naquele mesmo local). Havia uma sala ampla, onde fomos recepcionados com  salgadinhos variados, doces, sucos, leite e água. Eu , que gosto muito de coalhada, tive a oportunidade de saborear uma das mais gostosas de todos os tempos. Depois das nossas apresentações, Noélia entregou uma flâmula, que nós havíamos mandado confeccionar à mão, para que fosse lembrada da nossa visita ao Colégio. Em seguida, Nino usou da palavra, explicando que o nosso diretor não pudera ir e estávamos alí, para representar o nosso ginásio  e ao mesmo tempo agradeceu pela hospitalidade.

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 O professor de Educação Física, explicou das modalidades esportivas que seriam realizadas e adiantou que o almoço seria servido às onze horas e trinta minutos, para que todos os participantes tivessem um bom período de descanso. O salto em altura  começaria às 14 horas. O salto em distância daria sequência e finalmente o confronto entre as equipes de voleibol.
É claro que o pessoal do Colégio Florestal, quis mostrar o quanto eles estavam mais adiantados em organização, mas durante o almoço, soubemos por nossos alunos, que em matéria de ensino, ficavam muito aquém do nosso.
Em virtude dos alunos serem bem mais altos, devido a idade, eles ganharam facilmente a provas de salto em altura masculino e feminino. Mas para surpresa geral, José Manoel e Lúcia, nossos alunos, venceram o salto em distância, com pulos espetaculares, ganhando os apelidos de cangurus de Poções.
O pior aconteceu na partida de voleibol. O juiz era deles e estavam com as regras totalmente superadas. Nino não se conformou com a marcação adversa ao nosso time. O técnico deles veio de encontro a Nino e aí o entrevero quase se formou. Pacificamente retiramos o nosso time da quadra e demos à vitória a eles. Soubemos também, que no time de voleibol, que representava o Colégio Florestal, haviam colocado nada mais nada menos do que três rapazes da própria cidade, que não eram estudantes. Para evitar maior tumulto, como disse acima, saímos numa boa.
Quando o nosso caminhão estava de saída, logo após todas as despedidas e agradecimentos feitos, ouvimos uma gritaria onde várias crianças vinham se dirigindo ao mesmo e nas mãos de uma delas, estava a flâmula que logo cedo, Noélia havia ofertado ao Colégio, numa demonstração de apreço e consideração. O motorista parou o caminhão para sabermos do que se tratava. Aí o garoto que estava com a flâmula nas mãos, aproximou-se e disse a Noélia:
--- Dona, a senhora esqueceu esse “negócio”lá no Colégio.
Noélia desceu da boleia do caminhão e explicou ao garoto, que aquele objeto era uma flâmula que o nosso colégio trouxe de lembrança como um presente para o colégio dele.
Retornamos e ouvimos que brevemente Poções iria retribuir o convite ao Colégio Florestal. Provavelmente devido aos acontecimentos havidos na parte esportiva do voleibol, ninguém mais se atreveu a comentar o assunto e o convite de retribuição perdeu-se no esquecimento dos anos.
O tempo passou e chegamos ao dia 12 de outubro, numa noite fresquinha e estávamos passeando na Praça Deocleciano Teixeira, quando por volta das 21 horas, Nó acusou uma dor repentina, dizendo para mim:
--- Dy, senti uma pontada aqui em baixo da barriga.

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Noélia estava no nono mês de gravidez e a qualquer hora poderia nascer o nosso primeiro filho. De acordo com os cálculos feitos  pelo nosso amigo Bernardo Messias, baseado nas datas de nascimentos de Noélia e minha  ele nos disse alguns dias atrás, que seria um meninão bem robusto. Ressalte-se também, que naquela época não havia a aparelhagem que temos hoje em dia e cada palpite era diferente um do outro. Interrompemos o nosso passeio, levando-a à casa do Sr. Jambinho e avisei ao pessoal que iria procurar o Dr. Aloysio Rocha. Mas , lá por volta das 22 horas é que o Dr. Aloisio chegou e fez um primeiro exame em Noélia, afirmando que ela sendo PRIMÍPARA, a criança só iria nascer algumas horas depois.
Dona Jovelina, carinhosamente  chamada de “Meu Dó”, por todos da casa, era uma preta avançada nos anos,  que praticamente foi quem criou as meninas do Sr. Jambinho, tendo em vista que a mãe delas, Dona Alzira, já havia falecido há alguns anos atrás.(NÃO CHEGUEI A CONHECER AQUELA QUE SERIA A MINHA SOGRA).
Meu Dó, então, tratou de encher uma garrafa térmica com café, trazendo também vários tipos de biscoitos, onde colocou tudo aquilo, em cima de uma mesa, na sala de jantar, embora o pessoal da casa fizesse sempre as refeições na copa.
Percebi logo que o Dr. Aloísio não pretendia ir de volta para a sua casa, a fim de que fosse chamado mais tarde e ter de interromper o seu sono em plena madrugada. Assim começamos a conversar vários tipos de assuntos, sendo que o principal, para mim, era justamente parto, pois era completamente leigo no caso.
À medida que as horas passavam, recordei também, que há alguns anos atrás, por causa da política, ele e o Sr. Jambinho foram adversários políticos, como candidatos a Prefeito do Município. Os  anos haviam passado, e estávamos juntos sem que tivesse havido qualquer resquício de animosidade.
Enquanto nós  ficamos na sala, Noélia ficou deitada numa cama num quarto contíguo à mesma, pois ficaria mais fácil fazer qualquer atendimento. O tempo foi passando e o pessoal da casa começou a se recolher nos deixando à sós. Nó gemia de vez em quando e aí o Dr. Aloísio olhava o seu relógio de pulso e em certo momento comentou:
---Como eu já lhe disse essa criança, pelos meus cálculos só irá nascer ao raiar do dia de manhã.
E a nossa diversão, misturada com apreensão, era a de tomar café e comer biscoitos, vendo a noite despedir-se vagarosamente, dando lugar ao novo dia.
Era o dia 13 de outubro de 1959, uma terça feira. Alí por volta das sete horas da manhã, dando ao Dr. Aloísio, um trabalho incrível, nasceu a nossa primogênita Maria Sybele.

PRIMÍPARA: fêmea que dá a luz pela primeira vez.


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Contrariando todos os cálculos feitos pelo nosso amigo Bernardo Messias, ao invés de um garoto robusto e grande, nasceu uma garotinha bonitinha e toda marcada pelas ferramentas usadas na hora do parto. Foi normal, mas muito trabalhoso. Mas felizmente tudo ocorreu em paz e o pessoal já acordado, pode dar  também a sua mãozinha de ajuda na arrumação da bebezinha. Logo em seguida fui pessoalmente avisar a Papai e a Mamãe e esta me falou que logo após a arrumação de sua casa iria ver Nó.
À tarde, passou em frente da casa do Sr. Jambinho, uma procissão em louvor à Nossa Senhora de Fátima, onde algumas pessoas sugeriram registrar a menina com o mesmo nome da Santa, mas há muito tempo Noélia já havia escolhido os dois nomes: Leonard e Maria Sybele. Prevaleceu o segundo.
Dias depois ao encontrar-me com Bernardo Messias, e sabedor do erro, ele retrucou que foi algum dado que eu forneci erradamente. Como garanti ao mesmo que nada estava errado, ele me disse então, que no próximo filho, ele faria de novo as contas, para rentar acertar.
Como a nossa intenção era a de comemorar o primeiro aniversário de casamento, com a ainda pequena família, deixamos então, Sybele ficar mais recheiadinha e organizamos um almoço na sala de jantar da nossa casa alugada. Era o dia 8 de novembro, que caiu num dia de domingo, para facilitar o comparecimento de todos. Mas mesmo assim, domingo, era dificílimo e o Sr. Jambinho não pode comparecer. Desta forma contamos com as presenças de Amélia, Jurimar, Tereza, Papai e Mamãe. Tavinho havia viajado a serviço do INPS, pois era funcionário e também não pode comparecer. Naquele mesmo almoço divulgamos a todos os presentes que os padrinhos de Maria Sybele, seriam o Sr. Jambinho e Mamãe e recebemos muitos aplausos pela escolha feita.
O fato é que não tínhamos nenhuma experiência em cuidar da recém nascida e Nó começou a queixar-se que o seu leite era insuficiente para satisfazer a Sybele e desta forma passamos a dosar pequenas quantidades de leite em pó, misturando com água e intercalamos tais dosagens nos intervalos das mamadas. Num ponto deu tudo certo, pois Sybele começou a ganhar peso, entretanto, vivia constantemente com prisão de ventre, o que nos forçava a recorrer aos supositórios de glicerina, muito em moda na época.
Com algum dinheirinho que comecei a amealhar com os ganhos na Secretaria da Câmara, comprei na loja de Tavinho, uma bicicleta  da marca Mercksuic e com ela, corria mais apressado atrás do Dr. Aloysio , para trazer os remédios das necessidades de Sybele.
Chegamos também, ao final do ano letivo no Ginásio de Poções e a nossa missão estava cumprida.


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Noélia começou a dizer que o seu leite materno não estava mais saindo o que nos obrigava a dar uma maior quantidade de leite em pó misturado com água. Por outro lado, a menstruação ainda não voltara o que nos levou a consultar o Dr. Aloysio mais uma vez. Depois daquelas perguntas  de praxe, calmamente ele nos anunciou, que em setembro de 1960, nós receberíamos novamente a visita da cegonha. Ao chegarmos em casa, Nó apavorou com aquela notícia  e me disse:
---Dy, pelo amor de Deus, estou novamente grávida?
---Nó, por favor, entenda bem a situação. O que há de mal em termos o nosso segundo filho?
A coisa esteve preta nos dois primeiros meses de enjoo.
As aulas do ano letivo de 1960, recomeçaram e durante o segundo exame de admissão, já não houve mais a necessidade da presença do inspetor estadual .Nó, por sua vez, foi aceitando a segunda gravidez normalmente.
A turma da segunda série convidou os calouros para formarem um Grêmio Estudantil, que em eleição realizada pelos próprios alunos, recebeu o nome simbólico de “Ruy BARBOSA “. Elegeram como primeiro presidente, o aluno da segunda série ginasial, Carlos Ferreira Santos. Era um rapaz de boa índole, mas um pouco abobalhado em determinadas ocasiões. Basta citar um pequenino fato que ocorreu com o mesmo. Como as aulas eram ministradas no período matutino, para poder ganhar um dinheirinho, Carlos foi trabalhar na farmácia de Papai, no período vespertino e Papai tinha o hábito de ao chegar no final de cada mês, enviar uma cartinha aos seus clientes INADIMPLENTES, cobrando as suas dívidas na compra de remédios. Papai então para facilitar o trabalho de Carlos, colocava as cartinhas em ordem alfabética com os endereços  de cada um.
Num certo dia, Papai reuniu algumas cartinhas, chamou Carlos e lhe disse:
---Leve essas contas com a maior rapidez possível. Vá numa perna e volte na outra.
Esses dizeres de “vá numa perna e volte na outra”, eram sempre usados por pessoas que queriam o máximo de pressa em qualquer negócio. Mas o coitado do Carlos não conhecia aquilo e ao receber o pacote de cartas, saiu da farmácia pulando com uma perna no chão e a outra no ar e a medida que ia se afastando, trocava de perna, numa demonstração que atendera fielmente e ao pé da letra ao que Papai dissera.
Quando os dias iam se passando, os alunos sempre me procuravam, para que lhes desse alguns conselhos, na estrutura em organizar os diversos planos que lhes vinham em mente.
INADIMPLENTES: aquele(s) que não cumpre(m) as obrigações jurídicas estipuladas. Aquele(s) que não paga(m) o que deve.

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quinta-feira, 6 de junho de 2013

Autobiografia de Irundy Dias ( p 28 )




Dois dias depois da reunião do clube, Noélia e eu fomos convocados a participar de uma sessão da Fundação Ginásio de Poções, onde soubemos da continuação do curso preparatório que havíamos começado em dezembro e que continuaríamos de 10 a 20 do corrente mês, para que os candidatos ficassem bem preparados a enfrentar os exames de admissão .Na mesma reunião ficamos sabendo que somente os funcionários principais receberiam ordenados, enquanto o corpo docente colaboraria gratuitamente durante dois anos( 1959 e 1960 ). Com o intuito de ajudar Poções, numa educação mais adiantada, abraçamos de corpo e alma a feliz iniciativa e outras pessoas abnegadas também se chegaram para formar parte daquela turma. O Grupo Escolar Alexandre Porfirio, através de sua Diretora, Professora Jacy Dourado Rocha, continuou cedendo uma sala para que nós participássemos das aulas das 15 as 17 horas. Dona Jaci, era esposa do padrinho de Noélia, Deco Rocha, já citado linhas atrás, como um dos baluartes na instalação do curso ginasial.
Após o Grito do Carnaval, soubemos que Dr. Alcides Pinheiro dos Reis, casado com a tia de Zenaide Borges, que era uma das candidatas no concurso, foi com ela para Itabuna e Ilhéus, pedirem votos, pois tinham alguns parentes na região. Ao saber dessa notícia, Amélia, irmã de Nó, muito amiga do Sr. Valdemar Guimarães, pai da candidata Simone, realizou uma reunião na casa do Sr. Jambinho e naquele mesma noite decidiu-se ir a Salinas, angariar votos, com o apoio de Valmir Andrade. Era uma ideia mirabolante. Sairmos daqui de Poções para vender votos em Salinas, para uma candidata que ninguém conhecia e que também não iria em nossa companhia. Naquela mesma noite saímos num jipe alugado e amanhecemos em Salinas, ficando hospedados numa pensão. Não dormimos. Após um banho revigorante e um café prá lá de razoável, saímos à procura de Valmir Andrade e explicamos o motivo de nossa ida até ali. Muito prestativo,  ele nos levou às pessoas em que ele confiava na aquisição dos votos. O certo é que ao fim da tarde, o dinheiro arrecadado, deu parta pagar toda a viagem e a sobra foi revertida em votos. Como ainda eu não possuí uma conta bancária, arranjei uma caixa de sapatos de homem, com a respectiva tampa e ali fui colocando todo o dinheiro proveniente desde a primeira apuração. Fidelis Sarno havia me escolhido para tesoureiro do clube e ninguém sabia o jeito que eu dei para guardar aqueles cruzeiros.
Em quanto o clima do concurso da rainha do carnaval, predominava nos bate-papos da cidade, um pequeno e decisivo grupo, agigantava-se organizando os preparativos para o exame de admissão, já oficialmente marcado para o dia 16 de fevereiro, com as provas escritas e Português e Matemática, em caráter eliminatório. Finalmente chegou a noite da última apuração. Muita gente apareceu por lá no interesse de verificar o resultado e por volta das 22 horas, a vencedora foi Simone Guimarães, ganhando por larga margem de votos não deixando nenhuma contestação, quanto a lisura do empreendimento lançado pelo clube social. Não sei se foi a motivação, o certo  é que aquele carnaval deixou saudades para todos que dele fizeram parte. Os dias 8, 9 e 10 passaram numa velocidade estonteante e nossas atenções ficaram voltadas para o início dos exames de admissão. Naquela mesma semana, após o carnaval, o Conselho Estadual de Educação, enviou um dos seus conselheiros, na pessoa do Dr. Othoniel de Almeida Moura, irmão do nosso juiz da comarca, Dr. Ignácio de Almeida Moura, que veio com a missão de supervisionar os exames de admissão das cidades de Poções e Nova Canaã.

                                                                  
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Reunimo-nos na residência do Sr. Deco Rocha, para sigilosamente organizarmos o teor das provas escritas das cinco disciplinas envolvidas. As provas de Português e Matemática eram eliminatórias, mas Geografia, História e Ciências, pesavam no conjunto da média final. Com os resultados das provas escritas, seriam então desenvolvidas as provas orais, para obterem-se definitivamente os nomes dos aprovados. Quando a sessão foi iniciada, usou da palavra o Dr.Othoniel  de Almeida Moura, que era uma pessoa de baixa estatura, de cor branca e bem metódico nas suas palavras iniciais:
--”Minhas senhoras, meus senhores, a maior parte das pessoas presentes, já nos foram apresentadas e sabemos todos nós, que aqui estamos reunidos, para iniciar nesta cidade e na de Nova Canaã, um processo de nova aprendizagem”. É esta, uma reunião de caráter bastante e extremamente sigilosa. Nada do que for resolvido aqui, poderá ser comentado em casa ou em qualquer lugar. Não abriremos a “cancela”, para que todos os candidatos sejam aprovados. “Iremos sim, efetuar uma seleção de caráter bem ameno e logo após o final desta reunião gostaria de passar as vistas nas provas que os senhores todos já organizaram.”
Outras pessoas, também usaram da palavra, inclusive o Sr. Olímpio Lacerda Rolim , atual Prefeito de Poções, que prometeu ajudar na medida das possibilidades da Prefeitura.
Após a reunião, o Dr. Othoniel, foi verificando o conteúdo das provas, onde foi cortando os quesitos considerados muito difíceis, pedindo para que cada professor fosse refazendo o texto inicial. Na minha vez, bem baixinho, para que nenhum dos presentes escutasse:
---Meu caro doutor, desse jeito ninguém será aprovado em Matemática. Faça uns quesitos mais benevolentes.
Educadamente, retruquei, dizendo que durante o curso preparatório, nós ministramos, aqueles assuntos, que foram bem repassados, mas prometi fazer uma nova correção e trazê-los de volta, para uma nova apreciação.
As provas escritas e orais transcorreram num clima ameno e sem complicações. Ao final, verificou-se que, quem não tinha mesmo condições, não foi aprovado. Logo no ato da matrícula, perdemos uma candidata, pois os pais haviam sido transferidos para Nova Canaã.
Nascia, portanto, naquele mês de fevereiro de 1959, mais uma etapa na vida dos poçõense. Primeiramente, HOSANAS aos que tiveram a brilhante ideia de trazer o curso ginasial a estas plagas e posteriormente aos abnegados professores que carregaram e seguraram o barco, por muito tempo. Gostaria portanto, de lembrar das figuras iniciais, como : Dr. José Carlos Peixoto Pereira, além de primeiro diretor, exerceu a docência de Português, em companhia de sua esposa, que lecionou História do Brasil. Irene Gomes Lamego, que passou os primeiros ensinamentos de Canto Orfeônico. Clóvis Pereira Júnior, que chamou para si  a responsabilidade de ensinar duas línguas: Latim e Francês.

HOSANAS: aclamação jubilosa. Louvor . Expressão de alegria: Salve !  Ave !  Viva !


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Dr. Alcides Pinheiro dos Reis, que abordou os temas atraentes de Geografia do Brasil. Noélia Gusmão Alves Dias, que lecionou Desenho por algum tempo e mais tarde Geografia, quando o Dr. Alcides deixou o Ginásio, por motivos profissionais. E este, autor dessas humildes linhas, que sem nenhum preparo pedagógico , abraçou a Matemática e só a largou 40 anos depois. Essas hosanas, que se estendam também aqueles continuadores, dessa obra meritória. Dizem que o brasileiro tem memória curta, mas acredito piamente que o povo de Poções é uma exceção à regra.
Bravos meus amigos ! Bravos caros colegas !
Aos que ainda são vivos, o meu abraço de justiça e  amizade e aos que já se foram, que Deus os guarde, num cantinho todo especial.

Certo dia, a Professora Jaci Dourado Rocha, chamou-me reservadamente e comentou:
---A garotada gosta muito de suas aulas, deixando-os bem à vontade, embora estejam pedindo menor quantidade de conteúdo, para acompanharem tudo direitinho.
Agradeci a contemporização e esforcei-me bastante para atender o seu pedido, Pudera também. Nunca havia ensinado coisa nenhuma em sala de aula.
Fidelis Sarno, sabedor de mais uma ocupação que eu estava tendo, logo após os exames de admissão, marcou uma reunião de diretoria do clube social, para sabermos dos lucros obtidos com a realização do concurso da rainha do carnaval. Na noite escolhida, peguei a minha caixinha de sapatos, que estava guardada em cima de um dos guardas roupas do quarto, porque nela estavam  selecionados, toda a sorte de dinheiro e papéis das despesas que foram apresentados pelas candidatas.
Eram mais de 20 horas quando a reunião começou. Todos os componentes da diretoria, sorriam, enquanto eu ia desenrolando a papelada, juntamente com o dinheiro e alguns poucos cheques.
--- “Você não teve medo de ser assaltado dentro de casa”--- comentou alguém da diretoria.
--- Medo? Para que vocês tomem conhecimento, nem Noélia soube onde eu guardei tanto dinheiro.
De imediato o pessoal começou a ajudar-me para ganharmos tempo e após alguns minutos de contas feitas, verificamos que o sucesso fora total.
Dias depois, ainda no mês  de março, recebi um recado do meu aluno Carlos Ferreira Santos, que por sinal, estava trabalhando na farmácia com Papai, que este queria ver-me à noite em sua casa, pois seria o melhor horário, devido as minhas atribulações. Acertamos a noite sugerida e Noélia e eu, fomos saber do que se tratava. Enquanto Nó , foi conversar com Mamãe, Papai e eu ficamos na sala. Ali, ele me relatou  o seguinte:


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--- Seu Dy,  a senhorita Doninha Leoni, atual secretária da Câmara de Vereadores, irá mudar-se para Salvador, pois naquela cidade irá exercer um bom emprego. Provisoriamente, no seu lugar, ficará o atual ajudante, o nosso amigo Arnaldo Fagundes. O certo entretanto, é que a vaga está aberta e se você quiser ficar no lugar de Doninha, eu posso falar com o atual Presidente da Câmara, vereador Aníbal Carvalho .
Era uma boa proposta, pois à noite nada tinha que me impedisse em exercer aquela função. Mas, mesmo assim, respondi:
--- Pai, o senhor irá me ensinando, porque nada entendo desse assunto.
---Ótimo, eu só queria saber do seu interesse. Assim que Doninha  afastar-se eu o aviso.
Saímos de lá, eufóricos, mas pedi a Nó que mantivesse sigilo absoluto, pois assuntos que envolviam política, o segredo era uma boa arma.
As aulas do Ginásio continuaram a todo o vapor e misturando o atendimento aos meus clientes e as aulas com os alunos  da primeira série ginasial, quase me esqueci da proposta que Papai me fizera. No começo de abril, recebi uma comunicação por escrito, que comparecesse no local designado, para  assistir a uma das sessões da Câmara de Vereadores, que naquela época, funcionava na Rua Maneca Moreira , bem próxima da residência do Padre Honorato.
Mas Doninha Leoni só se afastou definitivamente do cargo em fins de abril e somente no dia 29 daquele mês, o Presidente da Câmara, empossou-me  no cargo de Diretor daquela Casa de Leis. Felizmente, todos os vereadores compareceram naquela noite e assim aos poucos fui tomando conhecimento dos seus nomes. À medida que os mesmos iam  usando da palavra, meticulosamente, ia anotando numa folha de papel de rascunho, os mais variados assuntos que eram ditos, para posteriormente, passar à limpo no livro próprio. No dia seguinte fi=ui procurar Papai na farmácia, para ensinar-me a redigir a ata da sessão e ele me disse, que a mesma é um resumo do que se passou e não precisaria ter copiado quase que integralmente o que fora dito na sessão.
Na sessão seguinte aconteceu o inevitável. Naquela época,  de acordo com o Regimento Interno da Casa, o Primeiro Secretário da Câmara, era o encarregado de fazer a leitura da ata da sessão anterior. Como sempre, eu tive uma caligrafia bonita, modéstia a parte, caprichei ainda mais, para que a pessoa não tivesse nenhuma dificuldade. Depois  de iniciada a sessão, o vereador que não irei declinar o nome, por questão de ética, começo a gaguejar na leitura da ata. Do meu lugar, fiquei nervoso por ele. Ou o camarada não enxergava direito ou era semi analfabeto. Resmungava mais, do que lia o que estava escrito. Enfim, era uma verdadeira MIXÓRDIA. Quando afinal ele terminou, virou-se para o Presidente da Câmara, Vereador Aníbal Gonçalves de Carvalho e disse :
 ---“ Quem é esse novo Secretário desta Câmara, que não sabe escrever direito o português ?”

MIXÓRDIA: misturada de coisas variadas. Confusão . Bagunça


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Como funcionário da Casa, eu não poderia falar nada em minha defesa, mas no Grande Expediente, como vereador, Papai pediu a palavra e disse:
---Senhor Presidente. Meus caros colegas. Deixei para este momento fazer uso da palavra, porque logo após a leitura da ata , não disporia do tempo necessário, para as observações que gostaria de fazer. Então, primeiramente gostaria de frisar ao nobre colega, secretário desta Casa, que fizesse um bom exame ocular com algum oftalmologista bem competente, para evitar que V, Exa., chegue aqui no plenário e após a leitura da  ata, venha a ofender ao mais novo funcionário, aqui presente. Em segundo lugar, gostaria de dizer que  a nossa gentil  diretora desta Secretaria, senhorita Josina Leoni, por seus grandes méritos, irá exercer em Salvador, um novo trabalho e por isso mesmo, a partir data, o seu lugar, será preenchido por um novo funcionário. É meu desejo, portanto, neste instante, apresentar a todos, o novo Diretor desta Câmara, que é o Dr. Irundy Manta Alves Dias, dentista, diplomado pela Faculdade de Odontologia da Universidade da Bahia, que como pessoa de nível superior, é muito capaz de preencher a lacuna agora existente. Como muitos dos presentes, ainda não o conhecem, devo também esclarecer, que a Fundação do Ginásio desta Cidade, convidou-o a participar da primeira banca examinadora dos exames de admissão e atualmente ele está ocupando a docência da disciplina matemática. Com todos esses méritos, é mais do que certo, que ele irá desempenhar a contento os nossos trabalhos, incluindo também, a boa redação de nossas atas, num português bem legível. Agradeço ao Sr. Presidente e a todos os meus colegas pela atenção que deram às minhas humildes palavras.

Por coincidência do destino, o referido vereador era semianalfabeto e depois das palavras veementes do vereador Dr. Ary Alves Dias, nunca mais abriu o bico para dizer nada e para evitar outros constrangimentos, a partir da sessão seguinte, eu mesmo, lia as atas. Outro fato que nós verificamos, é que a partir daquela sessão, o tal  vereador  somente aparecia de quatro em quatro sessões para não perder o mandato.

Dali em diante, comecei a entrosar-me nos serviços da Câmara e lá de vez em quando, solicitava ainda uma ajudinha de Papai.




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segunda-feira, 3 de junho de 2013

Autobiografia de Irundy Dias ( p 27 )

 No mês de novembro,  de 1958, a convite do nosso amigo Valmir Andrade, chegou a cidade, um bom grupo de desportistas, com a finalidade de estreitar as relações sociais, esportivas e amigáveis, entre as pessoas daqui e de lá da cidade de Salinas, situada ao norte de Minas Gerais, havendo inicialmente um confronto futebolístico entre as  seleções das duas cidades, num empate de 2 a 2.
Havia no centro da Praça da Igrejinha, uma quadra de chão batido, onde treinávamos de vez em quando. Ali mesmo, organizamos o jogo de voleibol, onde certas vezes, eu treinava como titular e em outras, como reserva. Naquele mesmo local., aproveitando o tamanho da praça, o falecido e ex-prefeito Tonhe Gordo, mandou construir uma área bem requintada, que hoje é utilizada para grandes eventos, principalmente para as Festas do Divino Espírito Santo.
No jogo de voleibol, o nosso time possuía três bons “cortadores”, nas pessoas de Zezito, um rapaz que residiu aqui em Poções, por pouco tempo; José Otávio Curvêlo, filho de uma das famílias mais ilustres de Poções, tendo sido há pouco tempo, Prefeito de Itapetinga, onde reside e exerce a sua profissão médica; Carlos Nei Dias Messias, que faleceu na cidade de Fortaleza há alguns atrás, quando na praia notou uma moça se afogando, tentou salva-la e morreu com ela. Conheci-o, com pouco mais de dois anos de idade, quando numa de minhas viagens, fiquei hospedado a convite do seu pai, Bernardo Espinheira Messias. No grupo de “levantadores”, só pude participar dos dois primeiros “sets”, pois a bola pegou de mau jeito no dedo anular da mão esquerda, afastando-me do restante do jogo; Vicente Sarno , que de vez em quando, ao vir de  Salvador, onde reside, recorda comigo daqueles bons tempos; Clóvis Pereira Junior( Nino ), já falecido em Niterói há uns dois anos atrás.Com aquele time de vôlei, hoje em dia com as regras totalmente mudadas, ganhamos do time de Salinas por três a zero.
Como o pessoal de Salinas, ficou satisfeitíssimo com a nossa recepção, convidou-nos para que em princípios  de janeiro de 1959, retribuíssemos a visita . À noite, houve uma festa dançante de despedida, onde todos os presentes se congratularam, com a renovação da promessa de irmos a Salinas em janeiro próximo.
Como prometemos aos diretores do grupo Fundação Ginásio de Poções, durante o mês de dezembro, no período da tarde, entre 15 e 17 horas, lecionamos gratuitamente, aos candidatos aos exames de admissão, fazendo uma pequena pausa no período, Natal/Réveillon.
Como a nossa diretoria do clube social, pretendia despedir-se solenemente, trabalhamos com todo o afinco  para deixar a sociedade local, com saudades de nossa gestão. E durante a festa, não me lembro de quem , partiu a ideia de se fazer o concurso da rainha do carnaval de Poções, algo inusitado na época. Por insistência de muitos sócios, ficamos de estudar o assunto, tão logo retornássemos de Salinas.
 O Natal, passou sem muitas preocupações, mas o Réveillon teria que ser uma festa de arromba. Mas o dia 31 amanheceu muito quente e durante a tarde, quando dávamos os últimos retoques no salão do clube, sentimos que teríamos chuva em breve.

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 Nó e eu jantamos normalmente e ficamos fazendo preparativos para a festa de Réveillon, que prometia ser das melhores. Era a nossa primeira festa depois de casados e morávamos há poucos metros dali. Com o calor que já se tornava insuportável, notamos alguns clarões de relâmpagos, seguidos de trovões, que com o passar dos minutos se tornavam mais fortes e mais AMIÙDE. Quanto mais se aproximava do horário do início da festa, que estava programada para ser iniciada às vinte e duas horas, maior era a claridade dos relâmpagos e muito maior a intensidade dos trovões, que se repetiam incessantemente. Aos poucos a chuva começou a cair e uma angústia começou a se apoderar de nós. Tão próximos morávamos do clube e mais inertes ficavam as nossas convicções. Possuíamos um guarda chuva, mas seria uma temeridade sairmos dependendo do abrigo dele. Chegaríamos ao Clube, totalmente “ensopados”. Eis que, ao chegarmos às vinte e duas horas e cinco minutos, ouvimos uma buzina de um carro à nossa porta. Era Fidelis Sarno, o presidente, com a sua caminhonete, que viera nos buscar. Abrimos o guarda chuva e nos enfiamos  dentro do carro, que percorreu aqueles metros que nos separavam do clube. Havíamos separado uma mesa em companhia do nosso vizinho Ernesto com a sua esposa, que desistiram de ir. Por sua vez, Tavinho, Dr. Ruy e Fidelis, que haviam reservado as suas mesas juntas, nos chamaram a fazer companhia com eles. De acordo o que fora decidido em reunião de Diretoria, naquela festa, sobre a mesa de cada sócio, seria posta uma garrafa de champanhe e na hora da saudação, à meia noite, Fidelis lançaria o concurso da rainha do carnaval como fora pedido pelos sócios. A minha mesa, foi vendida a outro sócio que chegou em última hora e nós dois ficamos ao lado daquela turma toda. À principio ficamos inibidos, mas a medida que a champanhe foi começando a fazer efeito, resultou numa euforia bem agradável. Reparem bem uma coisa: nós dois recém-casados ao lado daquele pessoal, todos eles acostumados a ingerir litros e mais litros de uísque.  Fomos na onda. Após o esvaziamento das três garrafas de champanhe, alguém sugeriu a continuar tomando champanhe, para não misturar com outras bebidas. Nó e eu que não tínhamos o hábito de ingerir tanta bebida fomos ficando grogues e rindo À-TOA. Dona Juraci, esposa de Fidelis, havia levado uns pedaços de frango assado, misturados com uma farofa incrementada, mas o efeito do champanhe já nos tinha atingido em cheio. Noélia sorria à valer. Minha cabeça parecia que tinha um bombo dentro. O jeito foi pararmos senão não conseguiríamos nem dançar.
Na hora aprazada, Fidelis fez uma bela saudação aos associados e suas famílias e por última explicou que a diretoria atendendo ao pedido do pessoal, lançava naquele instante o concurso da rainha do carnaval de 1959, e que na apuração daquela noite, só iriam concorrer as duas mais votadas. Durante a festa o voto seria gratuito, mas posteriormente, cada voto seria dado ao preço de um cruzeiro.
AMIÙDE: repetidas vezes. Frequentemente.
À-TOA: sem importância. Desnecessário. Que pode ser feito sem muito esforço. Que é desprezível.

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Depois das duas horas da madrugada, uma comissão de sócios nomeada por Fidelis, apuraram os votos da urna e verificaram que as duas moças mais votadas, cujos nomes  logo anunciados, foram: Zenaide da Silva Borges e Simone Guimarães. Essas duas então, seriam as indicadas pelos sócios ao concorrer ao com curso da rainha do carnaval de 1959, Logo depois das três horas Noélia e eu fomos para casa. A chuva já havia AMAINADO. Aos “trancos e barrancos”,   “bebinhos, bebinhos”, fomos praticamente, um apoiando ao outro e ao chegar no quarto de dormir, jogamos as peças das roupas, pelos quatro cantos e caímos na cama.
Quando o dia primeiro de janeiro de 1959, amanheceu,  acordei  enjoado e salivando bastante. Percebi que Nó, vomitava no chão ao lado dela, o que me provocou num náusea tremenda. Não tive também condições de levantar-me. Imitei-a, vomitando para o meu lado. Que cena DANTESCA. Foi a primeira e a última vez que isso aconteceu conosco. Desse detalhe, por muito tempo  não tomamos mais champanhe. Basta salientar, que muitos anos depois, durante o casamento de Maria Sybele, é que eu tomei um golezinho, somente para comemorar o evento. Noélia, nem isso fez.
Mal janeiro começara, quando chegou o convite de Valmir Andrade , endereçado ao Presidente da Liga de esportes de Poções, que por sinal não havia nem liga, quanto mais presidente. Mas foi uma mera formalidade, para que o convite fosse estendido aos desportistas da cidade. Como o assunto era sério pois envolvia a comunidade, reunimos as pessoas interessadas e marcamos o dia 9 de janeiro, que cairia numa sexta feira. Aqueles dias que antecederam a viagem, foram de uma expectativa tremenda. Reunimos o grupo de voleibol com apenas um reserva. Fiquei fora da lista, porque ainda sentia o dedo que fora machucado no jogo anterior. Enquanto isso, Antônio Luz e outros, organizaram o time de futebol. Combinou-se então, que sairia um caminhão com todo o pessoal interessado . Nino ajeitou o seu carro e ao seu lado, foi sentado o Carlos Ney. No banco de trás,  José Otávio, Nó e eu fomos confortavelmente instalados. Saímos as quatro horas da manhã pois a distância era bem grande e as estradas, não ofereciam nenhuma segurança para percorrermos com grande velocidade. Havia também a diferença entre um automóvel com cinco  e um caminhão com cerca de umas trinta pessoas. Na primeira parada que o automóvel de Nino fez, abastecemos com gasolina até encher o tanque. Fizemos um bom lanche, mas José Otávio e Carlos Ney acharam de beber várias garrafas de cerveja, naquela hora da manhã. Ficamos fazendo horário, até a chegada do caminhão e entre espera e lanche, perdemos quase duas horas. Então, ali no posto, combinamos que seguiríamos em frente e não mais esperaríamos o caminhão. Ao sairmos, entramos definitivamente no território mineiro.
AMAINADO: do verbo amainar, Diminuir a força do vento ou da chuva. Abrandar. Minorar. Acalmar. Tornar sereno.
DANTESCA: Relativo ao poeta italiano Dante Alighieri. Próprio do estilo do “Inferno” de Dante, primeiro poema da Divina Comédia. De um horror grandioso. Diabólico.

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No prosseguimento da viagem, José Otávio e Carlos Ney, nos deram um trabalho danado. Nino foi obrigado a parar o carro duas vezes, porque o efeito da cerveja enjoou-os de tal forma, fazendo-os vomitar sucessivamente, uma vez um, e na outra vez, o segundo. Depois, caíram num sono profundo, somente vindo a acordar, quando já se passavam das doze horas e Nó pediu a Nino que estacionasse o carro num local com sombra, para que pudéssemos almoçar. Nó, na véspera da viagem, mandara a nossa cozinheira preparar um franguinho cozido, com farofa de feijão verde e nós oferecemos aquele pequeno almoço, também aos três.  À principio os dois enjoados fizeram cara para não aceitar, mas Nó agindo como uma irmã mais velha, insistiu muito e advertiu aos dois:
---Se vocês não  comerem, aí  é que   irão passar mal, mesmo!
E ela estava certa. Depois que almoçamos, todos se sentiram com mais disposição. Entretanto, um novo dilema surgiu. A que distância ficava Salinas?. A gasolina colocada lá naquele posto começava a baixar no mostrador do carro. Em certo momento, Nino avistou um pessoal caminhando ao longo da estrada e reduzindo um pouco a velocidade do automóvel perguntou:
---Boa tarde, minha gente! Salinas está perto?
Um deles com o braço direito estendido e com o lábio inferior bem esticado, respondeu:
---Está ali...
Ficamos animados com a resposta, mas depois de uns vinte quilômetros, a gasolina estava quase zerada. Aí, Nino falou para nós todos:
---Pessoal o carro está praticamente sem gasolina. Vamos parar e esperar que algum carro passe e possa nos socorrer.
Eram mais de 16 horas, quando finalmente apareceu um jipe, vindo em sentido contrário. Nino explicou a nossa situação e pelos cálculos feitos entre ele e o motorista do jipe, concordaram entre si, que aquela quantidade de gasolina daria para chegarmos a Salinas. Mesmo assim, ainda paramos umas duas vezes ao encontrarmos andarilhos na estrada. Mas a resposta era a de sempre:
--- É ali ...
O fato é que, depois das dezessete horas  ( cinco da tarde ), chegamos a uma passagem estreita, onde duas pequenas elevações, (lados direito e esquerdo ),estavam apinhadas de pessoas, empunhando lenços brancos e bandeirolas, onde umas gritavam, outras saltitavam, alguns espocavam foguetes e fogos de artificio, num espetáculo de cores, deslumbrante. A recepção fora bem organizada, mas não sabiam que o caminhão estava bem atrasado. Nino estacionou o carro mais adiante e ao saltarmos fomos cumprimentados por várias pessoas que nos cercaram, inclusive com  a presença da Valmir Andrade, que certamente organizara aquilo tudo. Ao saberem do atraso do caminhão, fomos conduzidos para várias residências.


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A noite avançava. Tomamos banho e quando já estávamos à mesa jantando em companhia do casal que nos hospedou, ouvimos o espocar de fogos ao longe. Já se passavam das 20 horas. O restante da caravana finalmente chegara a Salinas. O casal  que nos hospedara, reuniu as três filhas para que conhecêssemos de perto. A mais velha, alcançara há dias atrás, os doze anos, a do meio estava entre seus seis a sete anos e a caçula beirava os quatro. Quando a conversa estava bem adiantada, já sabendo que eu era dentista, soube pelo pai, que o “colega” de Salinas, havia feito uma determinada restauração, num incisivo central de sua menina mais velha, umas quatorze vezes. Chamei a garotinha para perto de mim e com o apoio da luz refletida sobre a sua boca, verifiquei que naquelas condições, quantas vezes o tal colega insistisse, outras tantas a restauração não ficaria no local da cárie.. Aconselhei-o a leva-la a Belo Horizonte, procurando um dentista diplomado, para resolver o problema.
No dia seguinte, sábado, após o café da manhã, saímos e fomos encontrar o pessoal, para curtir a cidade, visitando os seus lugares mais interessantes. Num restaurante de relativo bom tamanho, adaptamos mais umas mesas e ali mesmo todos almoçaram. À tarde, continuamos a nossa visita a outros pontos de Salinas, que nos mostrou ser uma cidade pequena.
À noite, houve uma recepção no cinema local, quando em nome de todos nós, o meu mano Affonso, com um discurso invulgar, deixou muitos de nós e consequentemente, toda a plateia mineira, boquiaberta.
O domingo amanheceu esplendoroso e após o café, seguimos para o local onde seria realizado o jogo de voleibol. Novamente vencemos por três a zero, pois os mineiros ainda estavam nos primeiros passos daquele esporte.
Onde estávamos hospedados, o almoço foi servido ,quase ás quinze hora, pois aos domingos eles tinham a mania de dizer, que naquele dia da semana, ao invés de almoço no horário habitual, faziam uma espécie de ajantarado mineiro. Não sei se hoje em dia, a moda continua. Mas o certo, é que, almoçamos apressadamente com o intuito de correr ao estádio local, para assistirmos ao jogo de futebol. Assim que chegamos, soubemos que o time de Salinas já vencia por um a zero. Mas em determinado momento, aconteceu o que ninguém  esperava. Um dos nossos zagueiros atrasou a bola para o goleiro Antônio Luz, que inexplicavelmente ao invés de recolocar a bola em jogo, colocou-a sobre a linha da grande área e afastou-se como se fosse cobrar um tiro livre. Naquele mesmo instante, o centro avante deles, muito esperto, correu em direção à pelota e chutou-a para as redes do nosso gol. Com aqueles dois a zero, foi mesmo que ter jogado um balde de água fria em toda a equipe. Mais adiante, aconteceu o terceiro gol e fomos inapelavelmente derrotados. À noite ainda saímos um pouco, mas fomos dormir cedo, pois o retorno era longo. Assim que chegamos em Poções, recebemos um aviso de Fidelis Sarno, que reuniu a Diretoria e lançou  a ideia de fazermos um grito de carnaval, no dia 24 de janeiro, sábado, para realizarmos a primeira apuração dos votos do concurso da rainha do carnaval e no dia 4 de fevereiro, sem festa, a apuração final, pois o carnaval cairia nos dias 8, 9 e 10 e o tempo estava curto. Um pouco relutantes, os componentes da diretoria, meio CÉTICOS, quanto ao resultado do empreendimento, aceitaram.

CÈTICOS: no singular cético. Aquele que não crê. Que duvida de tudo. Que é desconfiado

                                            
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Autobiografia de Irundy Dias ( p 26 )

Nos meados de agosto de 1957,soube que um grupo de cidadãos desta Cidade, estava sempre se reunindo, com o objetivo primordial de conseguir junto às autoridades competentes  no âmbito estadual, a instalação do curso ginasial, o que viria a beneficiar inúmeras famílias locais. Posso com toda a segurança destacar os principais nomes daquela empreitada memorável, sem citar ordem alfabética, nem tampouco por suas atuações no enredo de toda a história. Vamos lá: Dr. Ruy Alberto de Assis Espinheira,  advogado que militou por muitos anos nesta Cidade de Poções, que aqui constituiu a sua família, chegando até a construir a sua casa à Rua Itália, onde com toda a sua energia e bons propósitos, colocando na época, como uma das melhores construções, já vistas nestas plagas. Ele também, participou da política local, como figura central em diversas ocasiões, candidatando-se a Deputado Estadual. Outra figura exponencial, foi o Sr. Miguel Lopes Ferraz, que por algum tempo ocupou o cargo de Gerente do Banco da Bahia, com a Agência sediada em Poções. A sua filha Cleide Ferraz, foi citada em linhas atrás, quando os estudantes de Poções, que faziam os seus cursos em outras cidades, participou de um lindo show realizado no Cine Santo Antônio, deixando gratas recordações  as todos. O Sr. Corinto Sarno de origem italiana, que batalhou incessantemente pela implantação do curso ginasial e como desenvolveu diversas atividades em Poções, chegou a receber em certa ocasião, uma Comenda Especial, pelos seus feitos em prol deste Município Hidelbrando Alves Rocha, o popular Deco Rocha, ex-gerente do antigo Cine Glória, onde hoje funciona a agência bancária do Bradesco, que juntamente com o seu sogro Antônio Castro Dourado Primo(seu Dourado),que foram os grandes baluartes na busca incessante, junto à Secretaria da Educação e ao próprio (CEE) Conselho Estadual da Educação. Lembramos também, da figura sempre solícita de Arnulfo Ramos Silva (Lulu), que mais tarde foi Prefeito de Poções e muito contribuiu, mais adiante, com uma ajuda substancial  para a sobrevivência do próprio colégio e numa determinada data, fizemos uma festinha singela, para dedicar-lhe os nossos agradecimentos, colocando o seu nome numa das placas das salas de aula. Entre outros nomes aqui não destacados, esses acima, foram os principais baluartes do aparecimento do ginásio aqui nesta cidade e sempre é bom frisar, porque a memória do povo é curta e em breve estarão perguntando como é que tudo isso começou?                                
                                                            Você sabia  ?
que alguns pais que tinham algum recurso financeiro, colocavam os seus filhos a estudar no Ginásio Taylor Egídio em Jaguaquara(que era o melhor na época, por essas bandas) ou em algum outro em Vitória da Conquista ?
que outros pais que também tinham parentes nessas cidades citadas, enviavam os seus pupilos, para dar-lhes
mais ensinamentos?
O que ocorria então em Poções ?
As crianças concluíam o curso primário e desde quando os pais não tinham algum recurso, ou por não possuírem parentes fora desta cidade, deixavam simplesmente de estudar. Poções, por sua vez, crescia vagarosamente, mas crescia...
Os intelectuais, os comerciantes, as pessoas de um bom tino administrativo e outros de boa vontade, começaram a fazer um movimento até que houve a criação da FUNDAÇÃO GINÁSIO DE POÇÕES, órgão que mais tarde, viria a ser o responsável pela implantação do cursop ginasial nesta cidade.
Mas o Brasil daquela época, quando se fala em BUROCRACIA, NÃO MUDOU AINDA EM NADA.
Diz a Enciclopédia  que :"BUROCRACIA é uma morosidade e exigências formais no desempenho dos serviços públicos".
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Pois a tal da burocracia emperrava o andamento dos papéis nas repartições estaduais de tal modo ,que dois amigos nossos Hidelbrando Alves Rocha (Deco) e Antonio Castro  Dourado Primo,( Seu Dourado ), residentes em Salvador, mas com vínculos fincados nesta terra, se desdobraram para conseguir o andamento da papelada. Depois, veio a parte física. Onde iria ficar  instalado o ginásio? Como conseguiriam  os funcionários principais? E o  mais importante: onde encontrar o corpo docente? E nessa lenga lenga, nesse sobe e desce, o tempo corria célere.  E 1957 foi embora.
O Ano de 1958 começou e os trabalhos entraram novamente naquele ritmo de vamos, vamos...
E a. nossa papelada? . Meio ano já ficara para trás. Será que 1958 iria seguir também os passos do seu antecessor 1957?
Em setembro, Noélia  e  eu achamos de juntar os nossos trapinhos.
Em outubro, soubemos por vias atravessadas, que os nossos nomes constavam de uma lista preliminar para ser aprovada e as reuniões  se sucediam quase diariamente, pois o ano estava a terminar e a aprovação do Conselho Estadual de Educação, sempre formalizava os seus projetos até o final de outubro, para que então a Secretaria Estadual de Educação desse o parecer final,  concedendo o funcionamento da abertura dos Ginásios para o ano imediatamente seguinte.
Ainda em outubro, uma senhora e outro funcionário estadual vieram a Poções e Nova Canaã, para fiscalizarem as instalações dos prédios onde iriam  funcionar os futuros ginásios.Aqui em Poções, foi escolhido o Prédio onde funcionava o Grupo Escolar Isaías Alves.
Felizmente a papelada ficou em ordem e Noélia e eu, fomos escolhidos a principio, para fazer parte da banca examinadora dos Exames de Admissão  e aí começou a ficar preta a posição da Direção da Fundação Ginásio de Poções em relação aos futuros professores. Numa reunião de muita conversa mole, ficou esclarecido que apenas o Diretor, a Secretária e o Auxiliar de limpeza e disciplina, iriam receber um salário modesto, para poder o Ginásio caminhar com os seus próprios pés. Os professores ensinariam gratuitamente, até que as coisas melhorassem.
Para início de conversa, disseram, que em novembro, nós professores, daríamos aulas gratuitas aos candidatos ao exame de admissão, para que ficassem mais envolvidos nos assuntos principais. O local escolhido foi o Grupo Escolar Alexandre Porfírio e todos os dias das 15 às 17 horas ,estava lá o grupo encarregado, para ministrar e dar os pormenores de como seriam os exames de admissão.Tais preparativos foram estendidos até às vésperas do Natal. Iniciado o ano de 1959, fomos avisados que do dia 10 até 20 de janeiro, repetiríamos a dose, para que todos os candidatos ficassem bem "afiados", como se diz na gíria.
Nesse ínterim, houve uma excursão de um grupo de desportistas daqui, para a cidade de Salinas, ao norte de Minas Gerais, onde passamos três dias, num congraçamento sócio-esportivo.
Ao regressarmos, soubermos também, que as datas dos exames já haviam sido marcadas para os meados de fevereiro e que estaria nesta Cidade para orientar todo o pessoal, um funcionário graduado do Conselho Estadual de Educação, que também iria a Nova Canaã, porque as datas escolhidas foram as mesmas ,para poupar tempo.
Finalmente chegou o dia 16 de fevereiro, uma segunda-feira e às 8 horas foram realizadas as provas escritas de Português e Matemática, ambas eliminatórias.No dia seguinte, para os candidatos que ultrapassaram a primeira barreira, as provas também escritas,  de Geografia, História do Brasil e Ciências.Nos dias seguintes realizaram-se as provas orais com os meninos ainda tensos, mas a turma da banca examinadora,deixou-os mais à vontade, com piadinhas, a fim de tornar o ambiente bem agradável.
Uns dois dias após, o resultado favoreceu à vinte e cinco jovens entre 13 e 18 anos, que de imediato juntaram a papelada, para a matricula á primeira série do curso ginasial.
Numa reunião, logo depois dos exames, nós professores, fomos cientificados, pela Diretoria da Fundação Ginásio de Poções, ( e faço questão de colocar tudo isso em letras maiúsculas para que sempre a população de Poções se recorde desse detalhe que) DURANTE DOIS ANOS SEGUIDOS IRÍAMOS LECIONAR GRATUITAMENTE A FIM DE QUE O GINÁSIO PUDESSE IR AVANTE.
MAS NÃO FORAM DOIS ANOS! FORAM SIM, TRÊS ANOS CONSECUTIVOS: 1959, 1960 E 1961.
        
                                      FIM  DA  PRIMEIRA   PARTE.



                                     SEGUNDA PARTE
 
CONTINUAÇÃO DO RELATO, AINDA COM DETALHES ANTERIORES AOS EXAMES DE ADMISSÃO.

                                     
Um fato interessante ocorreu comigo dois dias antes, do início dos exames das provas escritas. 
O Conselho Estadual de Educação, incumbiu a um dos seus membros efetivos a vir até Poções, para supervisionar e ao mesmo tempo orientar as bancas examinadoras desta Cidade e de Nova Canaã, na pessoa do Dr Othoniel de Almeida Moura, por sinal, irmão . do nosso Juiz da Comarca, Dr. Ignácio de Almeida Moura.
Ao chegar em Poções, ele foi recebido pela  Diretoria da Fundação Ginásio de Poções e promoveu logo uma reunião, principalmente com os componentes da banca examinadora para saber do conteúdo das provas.
Na minha vez, ao ler os dez quesitos da prova, ele reservadamente cochichou ao meu ouvido:
"--- Professor, refaça esses dez quesitos, pois dessa forma, ninguém será aprovado."
Naquela mesma noite de sábado, refiz a prova e no domingo, procurei-o e tornei a mostrá-lo. Ele riu bondosamente e disse-me:
"---Meu caro doutor, mesmo assim ,muita gente ainda será reprovada."
É claro que nós professores,entramos naquela tarefa, para colaborar, mas de maneira alguma, iríamos "abrir a cancela", pois os aprovados, seriam daqui há alguns dias, os nossos alunos e nós teríamos  que aguentar pelo ano inteiro, grande parte de ineptos.
Felizmente, para todos, os aprovados, demonstraram boa aptidão, bem interessados, com bom comportamento,proporcionando aos professores, um excelente trabalho pedagógico.
O Diretor, por nome Dr. José Carlos Peixoto Pereira, um dentista recém chegado a Poções, em companhia de sua esposa, foram incumbidos de lecionar Português e História do Brasil,respectivamente. Matemática, coube aqui, ao Papai, que na época,não entendia nada da parte pedagógica. Eu só queria ensinar , demonstrando que a ciência dos números, por enquanto, estava em boas mãos. Geografia, ficou entregue ao nosso velho  amigo ,Dr. Alcides Pinheiro dos Reis, que depois de um ano e meio, veio a se tornar o segundo Diretor do Ginásio, visto que o Dr. José Carlos, como dentista, não estava tendo clientes suficientes para continuar nesta Cidade. Ciências foi ministrada até certo tempo, pelo Dr. Antonio Rocco Libonati , médico, recém formado, filho de uma das mais ilustres famílias italianas, na pessoa do seu pai, Américo Libonati.  Desenho, coube á minha  esposa  Noélia. Canto Orfeônico , à minha comadre, a Professora Irene Nápoli Lamego . As línguas Francês e Latim ficaram sob a responsabilidade do nosso amigo Clóvis Pereira Junior, que diga-se de passagem, durante os primeiros anos da História do Ginásio em Poções, foi um dos grandes baluartes para que tudo desse certo .Com esse corpo docente formado, iniciamos a nossa batalha.
Uma certa noite fomos avisados de uma reunião com a Diretoria da Fundação Ginásio Poções, onde nos comunicaram, que tendo em vista uma doação que a Prefeitura fizera a Fundação,de um terreno que se estendia até à Rio- Bahia, que brevemente, nós seríamos agraciados com um lote, para compensar o esforço que teríamos de fazer nos próximos anos.
Vale também, aqui ressaltarmos, que nesses primeiros três anos de ensino gratuito, por parte dos professores, outros amigos nossos, deram a sua parcela de colaboração, sempre visando que a ideia vingasse e que o curso continuasse firme.Apelando agora, para a nossa memória, iremos citar que durante o período dito inicial, houve sempre algumas mudanças, visto que alguns dos titulares se ausentavam. Assim, em certa época, contamos com o apoio decisivo e inestimável da Professora Madalena Curvêlo, do seu irmão, José Otávio Curvêlo, há pouco tempo atrás, Prefeito de Itapetinga.   Com o queridíssimo jovem(que o vi desde quando estava com três  anos de idade) ,Carlos Ney Dias Messias, falecido nas praias de Fortaleza, quando tentou salvar uma jovem de afogamento e morreu com ela. O nosso mano
Affonso Manta, também falecido, que também forneceu muitos subsídios históricos, durante o pouco tempo que ajudou ao Ginásio. O Sargento Severino Bispo dos Santos, com altos e baixos, deu também a sua colaboração.Um belga, que sofrera horrores durante a Segunda Guerra Mundial, apareceu por aqui, não se sabe vindo de onde e prestou também a sua ajuda, lecionou Francês por algum tempo, com aquele sotaque bem fechado,  característico da própria Língua e referindo-se ao aluno Paulo Silva Dantas, dizia:
"--- Pôlo!
Não nos esquecemos também da valiosa contribuição do Dr. Mário Sabino Costa.
Mais adiante, contamos com a valiosíssima ajuda da Professora Maria da Glória Macedo da Conceição, que por anos afora, tornou-se  uma das maiores mestras do ensino, nesta terra abençoada pelo Divino Espírito Santo.E por aí afora, seguiu-se uma lista interminável de pessoas gradas e de alto espírito, que em certa ocasião, num daqueles desfiles memoráveis  de 7 de setembro, fizemos uma homenagem, onde cada grupo de dois alunos, levava o nome dos ex-professores escritos numa faixa, alusiva aos serviços, por eles prestados à comunidade.
Com o decorrer do tempo, fomos verificando que a Diretoria da Fundação Ginásio de Poções, foi ficando omissa, nos principais  assuntos financeiros. Provavelmente, eles já haviam cumprido e bem o seu papel desbravador e naqueles momentos,estavam tentando passar o timão, a outros .
Ressalte-se, que a verba arrecadada mensalmente, pelo pagamento, que os pais faziam, para custear o estudo dos seus filhos, mal dava para efetuar o pagamento da folha do Diretor,da Secretária e do Zelador, além das pequenas despesas com material escolar, de limpeza e outras menores, porém necessárias.
Convivemos assim, nesse ambiente, por larga temporada, até que em dezembro de 1961,já próximo ao Natal, ou seja 2 anos e 10 meses, após a largada inicial, sem sabermos o motivo, fomos convidados pelo  Prefeito Olímpio Lacerda Rolim e como grata surpresa, cada professor, recebeu a importância de um mil e quinhentos cruzeiros.
Mas, à partir de 1962, com a aprovação da Câmara de Vereadores de Poções, o Sr Prefeito, incluiu no Orçamento, uma verba, para pagamento mensal aos Professores, uma gratificação pequena,mas que terminava de uma vez por todas, aquele serviço de gratuidade.
ISSO, FOI SÓ O PRINCÍPIO...


                                              FIM   DA   SEGUNDA PARTE.


                                              TERCEIRA PARTE
CONVÍVIO   COM   OS   ALUNOS, SEUS ANSEIOS  ,  SUAS  BUSCAS ,  SUAS REALIZAÇÕES.

Em 1959, quando foram iniciadas as aulas no mês de março, com a turma de 25 alunos, na primeira série ginasial, em pouco tempo, foram absorvendo o novo tipo de ensino. Eles que estavam acostumados, a lidar com apenas um professor, que lhes ensinavam todas as disciplinas, estavam agora, às voltas com vários tipos de pessoas, onde cada uma delas, possuía o seu modo de lecionar, ou de transmitir o conteúdo de cada matéria do currículo escolar.
Ainda no mês de março, se organizaram para fundar o grêmio estudantil ,ainda sem estatuto, mas com o nome de Ruy Barbosa escolhido,com o presidente Carlos Ferreira Santos também eleito por unanimidade,enfim um grupo decidido a levar avante o nome da classe estudantil. Através de um oficio, escrito a mão e assinado por todos os componentes da turma, comunicaram a sua decisão, ao Diretor do Ginásio e  reforçaram dizendo verbalmente aquilo que eles estavam em mente. Mas os dias se passaram e como eu lecionava duas  aulas seguidas, em certa manhã, quando eu estava terminando a primeira aula, o Presidente do Grêmio, levantou-se e disse- me que os colegas queriam conversar comigo, à respeito de como organizar o grêmio e o que mais ocorresse. O certo, é que depois de uma conversa animada, onde trocamos várias idéias, ficamos de ir em grupo até a  Prefeitura Municipal a conversar com o Prefeito Olimpio Rolim , a fim de pedir ao mesmo, um espaço de terreno de  mais ou menos seis metros quadrados, para que durante os festejos do Divino Espírito Santo. pudéssemos armar uma quermesse.
Dias depois, o Ginásio recebeu um convite, endereçado ao Diretor, para que no final de abril, num dia  de domingo, fôssemos a Nova Canaã, passar algumas horas com os alunos da primeira série do Ginásio Florestal e lá participássemos de um jogo de voleibol  e das competições de saltos em altura e distância.
No convite,  especificava ainda, que no time de voleibol misto, poderiam ser incluídos três elementos não pertencentes ao Ginásio, por que nem todos os alunos, sabiam  praticar o tal esporte.
Embora cientes daquele convite, o fato é que o pessoal estava focado na organização da quermesse e as idéias se multiplicavam a cada dia que passava. Alguns  dias, saímos à tarde pelo comércio, solicitando brindes, dados ou emprestados, que seriam colocados à venda ou simplesmente através de rifas.
Inventamos um tal de "correio sentimental", onde cada pessoa poderia mandar uma mensagem, pagando  naturalmente, uma pequena taxa pelo serviço.
Quando estávamos próximos da ida a Nova Canaã, o Diretor simplesmente disse que não poderia ir e abriu vaga para quem estivesse disposto a acompanhar os alunos. Organizamos então, o grupo com todos os alunos. Acompanhando-os, fomos: Clóvis Pereira Junior ( o Nino), que também era o professor de Educação Física, Noélia e eu.   O Prefeito  Olimpio Rolim, forneceu o caminhão com o motorista e lá fomos nós.
Em Nova Canaã, fomos recebidos por um grupo de Professores que nos levaram até ao Ginásio Florestal.onde desfrutamos de um lauto café matinal. O resto da manhã, foi descontraído, com conversas de todos os tipos, mais associadas ao desempenho dos nossos trabalhos escolares.
Almoçamos e após o descanso regulamentar, os estudantes foram participar das competições esportivas.
Perdemos em salto em altura mas  vencemos em salto em distância, com a performance espetacular da nossa aluna Lucia Maria da Silva. A partida de voleibol não chegou ao fim, pois Nino não concordou com o time que entrou em quadra para jogar contra os nossos alunos. Eram pessoas totalmente estranhas ao  corpo discente do Ginásio Florestal. A fim de não haver briga, a partida foi encerrada mal havia começado.
O Ginásio de Poções, através do Sr. Diretor, ficou de retribuir a visita e até hoje,2013, ninguém lembrou-se de tal fato, sucedido ainda em 1959.
Chegamos finalmente aos dias da festas do Divino.Armamos em plena praça, próxima ao serviço de som do parque, uma barraca retangular, com 3 metros de comprimento na frente e no fundo e com 2 metros em cada lateral.Cobrimos com uma lona emprestada. Colocamos uma mesa grande no centro, com os objetos que havíamos conseguido dias atrás no comércio local.Para o pessoal não se cansar e também desfrutar dos dias das festas, fizemos um serviço de revezamento entre os alunos, onde todos com a máxima boa vontade, saiam vendendo bilhetes das rifas, enquanto outros permaneciam dentro da barraca,vendendo objetos e enviando mensagens através do serviço de alto falantes do parque.
Foram dez noites de intensa labuta, mas os resultados saíram satisfatórios. Dos objetos vendidos, nós tiramos o lucro, e o restante, pagamos aos proprietários, como também, a mercadoria encalhada, restituímos aos respectivos donos.
O certo é que, uma pequena importância foi amealhada o que deu ânimo a todos ,a repetir o sucesso inicial nos anos subsequentes.
E aí em 1960, com a nova turma de primeira série ginasial, começou a ciumada em cima de mim. Certo dia, em plena aula de matemática, uma garota, levantou-se da cadeira e me disse:
---Dr. Irundy, o senhor gosta mais da turma da segunda série, não é mesmo ?
Aí eu fui explicar com toda a minha calma, que não era aquilo que ela ou os demais, estavam pensando de mim.
---No ano passado, ninguém se levantou para ajudá-los. Fiquei com eles o tempo todo e não é justo que esse ano eu os abandone, só porque vocês chegaram como calouros. Não quero ciumadas. Vou ajudá-los, assim como fiz com a turma da segunda série. É só terem paciência.
E de fato, para não  haver concorrência entre as duas turmas, quando chegamos à época das festas do Divino, a turma da primeira série armou uma barraca quermesse nos mesmos moldes do ano anterior, enquanto a turma da segunda série, colocou a funcionar uma barraca igual às outras que sempre funcionaram, com mesinhas, cadeiras, balcão para atendimento geral, geladeira e um som horrível, que ficava ligado enquanto o do parque não funcionava. Então, com aquele mesmo revezamento já feito em 1959, todos trabalharam e se divertiram sem nenhuma queixa. Para evitar novamente a ciumada, eu me revezava, passando um tempinho aqui e outro ali e aconselhando  sempre a uns e outros.
Findos os trabalhos, a quinta série ficou satisfeita com o resultado e a sexta mais ainda,  pois embora o trabalho fosse maior, o lucro então, superou o arrecadado no ano anterior.
E essa história repetiu-se em 1961, já com mais uma turma em andamento, até que à partir de 1962, os próprios alunos chegaram a um acordo, que para ninguém prejudicar as turmas mais adiantadas, somente aquelas, armariam a barraca na festa do Divino. Com essa resolução tomada pelos alunos, fiquei mais tranquilo, pois durante as Festas, eu já não sabia direito a quem atender.
Então, antes das férias de junho/julho de 1962, os alunos da quarte série ginasial, promoveram uma reunião para que depois do recesso escolar do meio do ano,entrassem de vez com um novo plano.
E o Papai aqui teve a ideia e falei com  eles  o seguinte:
---Como a barraca da festa sempre foi um ganho seguro, porque não lançarmos o Concurso da Rainha da Primavera com votos vendidos a um cruzeiro cada. Para isso ,entretanto,o primeiro passo é procurar as meninas que estejam dispostas a nos ajudar.
Na volta às aulas, uma garota da primeira série, por nome Margarida Maria Nunes de Sá, prontificou-se a vender os votos. Às vezes saía acompanhada de colegas e na maioria de suas investidas, pedia os votos sozinha. E não apareceu mais ninguém para ajudar. Como eram votos vendidos, não houve necessidade de se saber quem ganhou,pois ela, Margarida foi a primeira rainha da primavera do ginásio de Poções. E não me recordo se houve mais alguma com esse mesmo título.
O tempo passou e ao iniciar-se o mês de novembro de 1962, um novo pedido veio a tona, através de minha pessoa. Vale frisar, que o Diretor José Carlos, já havia se mudado com a família para  outra cidade e a Diretoria foi ocupada por Dr. Alcides Pinheiro dos Reis, que não se opôs ao pedido feito pela turma da quarta série.
Por iniciativa da turma,resolveu-se que, dez dos alunos  se prontificaram a participar de um passeio
à Salvador, que na época era chamado de" EMBAIXADA". Os dez alunos, à pedido dos próprios pais só iriam, se fossem acompanhados de professores. Então, de comum acordo, os alunos escolheram
para acompanhá-los, Dr. Irundy, Professora Noélia e Margarida, esta última ,como gratidão aos serviços prestados à turma.Formou-se então, a EMBAIXADA com 13 pessoas.
O pedido feito ao Dr.Alcides foi o de:  antecipar as provas finais da turma, ou então deixar para fazê-las quando voltassem do passeio. Prevaleceu a última hipótese.
Para que todos os leitores tenham a exata noção de como as coisas eram difíceis naquela época, vale salientar nesse episódio, que durante quatro anos, desde 1959 até novembro de 1962, os alunos da quarta série ginasial, conseguiram "juntar", a importância  de pouco mais de OITENTA E DOIS MIL CRUZEIROS.
Em Salvador, um amigo nosso ,casado com a filha do Sr Alcides Fagundes, por apelido BEQUINHO, fez um precinho camarada para a turma; 32 mil cruzeiros por três dias de hospedagem, com direito a dormida, café da manhã, almoço e jantar, para as treze pessoas da EMBAIXADA.
Separamos também, o dinheiro das passagens de ônibus, táxis e despesas necessárias para a viagem de ida  e de volta.
O restante seria gasto nos passeios. Com a inteira confiança deles em minha pessoa, todo o dinheiro foi  entregue a mim, para que eu me incumbisse de efetuar todos os gastos .Então uma outra preocupação: a de anotar num papel, tudo o que era efetuado como despesa geral. Cada qual, separadamente, levara algum dinheirinho para seus gastos pessoais .
De início, fomos na manhã de sexta feira à Igreja do Bomfim, para que eles conhecessem e ao mesmo tempo agradecer por tudo o que alcançaram, desde o ingresso a primeira série ginasial e a sucessão de acertos e erros, que se seguiram durante os quatro anos de estudos  e  trabalhos para chegarem até ali.
Conheceram o Porto da Barra(indo à praia, é claro) , Amaralina e Itapoã.
Deixamos para o domingo, um passeio à ilha de Itaparica,ficando naquele recanto paradisíaco, o dia todo.
Ao regressarmos, muita alegria, sem nenhum acontecimento que desabonasse a conduta de qualquer um dos participantes.
No primeiro reencontro em plena sala de aula, fiz a prestação de contas, com tudo anotadinho, centavo por centavo, e dei-lhes uma boa surpresa. Havia sobrado a pequena importância de dois mil cruzeiros e alguns centavos. O que fazer  ?
Rapidamente apareceu a solução. Fazer uma festinha de despedida da turma toda. E fizeram!
Observações finais:
Em 1959, ano em que o curso ginasial foi iniciado em Poções, serviu de entrada para que todos os alunos, ano após ano, se voltassem a organizar durante as festas do Divino Espírito Santo, as tradicionais barracas dos estudantes, cuja melhoria foi se acentuando com o decorrer do tempo. Na época, onde se implantou a luz negra, nos reservados das barracas, a afluência era bem maior, porque os casais iam ali para desfrutar alguns momentos de boa dança, na maior seriedade, mesmo porque havia a vigilância severa dos próprios donos. Mas o Monsenhor Honorato, só achava de fazer as suas implicações contra os estudantes, chegando ao ponto de incluir no seu sermão. as suas palavras de desconforto para os alunos do Ginásio.E esse detalhe que estou frisando aqui, surgiu desde o tempo inicial, quando as meninas iam se exercitar nas aulas de Educação Física, e ele, ficava com o seu binóculo, sentado na sua varanda, olhando de lá , procurando descobrir, se alguma garota estava seminua ou coisa parecida,atentando aos bons costumes. E por aí afora, nunca ouvimos dele, alguma palavra de apoio ou de elogio.Essa mágoa que todos nós ficamos, foi se dissipando com o tempo, pois fomos aprendendo, que com todo o trabalho saudável que apresentávamos, sempre havia uma nesga de insatisfação.
Durante anos e anos, outras turmas se organizaram, com passeios ao Rio de Janeiro, por duas vezes, Porto Seguro, algumas excursões e dezenas e dezenas de passeios, com toda a moralidade possível, por esse Brasil afora.
De minha parte, quero concluir, que sempre me dediquei com todo o amor  possível, vendo o colégio crescer, ajudando dentro de minhas parcas possibilidades.
Em 1964, a Fundação Ginásio de Poções, deixou de existir e passou as rédeas do comando a antiga Campanha Nacional de Educandários Gratuitos(CNEG), que de gratuidade não tinha nada, chegando até nós, as maiores críticas feitas por pais, ou responsáveis, pelos alunos matriculados.Os próprios dirigentes sentindo em todas as partes do Brasil, aquele acumulo de críticas, resolveram algum tempo depois, mudar a sigla e o sistema de funcionamento, passando a ser conhecida por CNEC( Campanha Nacional de Escolas da Comunidade).
 


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