quarta-feira, 12 de junho de 2013

Autobiografia de Irundy Dias ( p 29 )

Minha cunhada Jurimar, que estava de namoricos com o seu primo Elvécio Nápoli (Vecinho), em comum acordo resolveram terminar aquele compromisso, devido a insistência de diversos parentes que alegaram que relações com primos, nunca deram certo. Então, dias depois, olhem Dona Jurimar já de namoro firme com um cearense, por nome Hélio Pinto Vieira, primo do Sr. Cesar Barrocas, onde ambos  ficaram encarregados de supervisionar as obras do açude de Morrinhos, que estava sendo construído pelo DNOCS (Departamento Nacional de Obras Contra as Secas).
Enquanto isso, durante os Festejos do Divino Espírito Santo, já em fins de maio, o Diretor do Ginásio de Poções, Dr. José Carlos Peixoto Pereira, recebeu um convite da direção do Colégio Florestal de Nova Canaã, para irmos até lá, no dia 7 de junho, um domingo, a fim de entrosarmos, os nossos alunos, professores e dirigentes, numa confraternização geral, onde teríamos a oportunidade de jogarmos uma partida de voleibol e duas provas de atletismo, como sendo salto em altura e salto em distância. O Dr. José Carlos, leu a carta em voz alta, em plena sala de aula, para que professores  e alunos ficassem cientes do convite que acabara de receber. Alegou porém, que por motivos particulares, ele próprio, declinava do convite, mas delegava  poderes aqueles que desejassem ir conhecer a cidade de Nova Canaã e os colegas da primeira série ginasial.
O domingo escolhido amanheceu com um sol radiante, embora aquele friozinho seco das noites de junho estivesse presente. Mas, em Canaã, zona da mata, imperava o calor e por isso mesmo, ninguém se atreveu a colocar nenhum agasalho. O Sr Prefeito Olímpio Lacerda Rolim, forneceu um motorista com o caminhão alugado para nos levar até aquela cidade e lá chegamos por volta das nove da manhã. A caravana ficou formada por dezenove pessoas, sendo dezesseis estudantes e três professores, estes que se apresentaram com boa vontade, desde quando nem o Diretor, nem os demais professores demonstraram interesse em participar do evento. O caminhão estacionou numa pracinha e por incrível que pareça, já nos esperavam, com bandeirolas e espocar de foguetes. Inúmeras crianças, misturadas entre alunos e outras da cidade, saltitavam e pulavam em cada lado do caminhão. Saltamos e solicitamos aos nossos alunos que descessem vagarosamente para que ninguém se machucasse. Os estudantes de Nova Canaã, eram em sua maioria, com mais idade e também maiores no tamanho. Enquanto a nossa média de idade variava entre 14 e 15, os de lá, acredito, ficavam numa faixa superior em anos. Fomos convidados a subir uma ladeira, pois o Colégio fora construído, lá no alto( não sei dizer, se hoje em dia, ainda continua naquele mesmo local). Havia uma sala ampla, onde fomos recepcionados com  salgadinhos variados, doces, sucos, leite e água. Eu , que gosto muito de coalhada, tive a oportunidade de saborear uma das mais gostosas de todos os tempos. Depois das nossas apresentações, Noélia entregou uma flâmula, que nós havíamos mandado confeccionar à mão, para que fosse lembrada da nossa visita ao Colégio. Em seguida, Nino usou da palavra, explicando que o nosso diretor não pudera ir e estávamos alí, para representar o nosso ginásio  e ao mesmo tempo agradeceu pela hospitalidade.

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 O professor de Educação Física, explicou das modalidades esportivas que seriam realizadas e adiantou que o almoço seria servido às onze horas e trinta minutos, para que todos os participantes tivessem um bom período de descanso. O salto em altura  começaria às 14 horas. O salto em distância daria sequência e finalmente o confronto entre as equipes de voleibol.
É claro que o pessoal do Colégio Florestal, quis mostrar o quanto eles estavam mais adiantados em organização, mas durante o almoço, soubemos por nossos alunos, que em matéria de ensino, ficavam muito aquém do nosso.
Em virtude dos alunos serem bem mais altos, devido a idade, eles ganharam facilmente a provas de salto em altura masculino e feminino. Mas para surpresa geral, José Manoel e Lúcia, nossos alunos, venceram o salto em distância, com pulos espetaculares, ganhando os apelidos de cangurus de Poções.
O pior aconteceu na partida de voleibol. O juiz era deles e estavam com as regras totalmente superadas. Nino não se conformou com a marcação adversa ao nosso time. O técnico deles veio de encontro a Nino e aí o entrevero quase se formou. Pacificamente retiramos o nosso time da quadra e demos à vitória a eles. Soubemos também, que no time de voleibol, que representava o Colégio Florestal, haviam colocado nada mais nada menos do que três rapazes da própria cidade, que não eram estudantes. Para evitar maior tumulto, como disse acima, saímos numa boa.
Quando o nosso caminhão estava de saída, logo após todas as despedidas e agradecimentos feitos, ouvimos uma gritaria onde várias crianças vinham se dirigindo ao mesmo e nas mãos de uma delas, estava a flâmula que logo cedo, Noélia havia ofertado ao Colégio, numa demonstração de apreço e consideração. O motorista parou o caminhão para sabermos do que se tratava. Aí o garoto que estava com a flâmula nas mãos, aproximou-se e disse a Noélia:
--- Dona, a senhora esqueceu esse “negócio”lá no Colégio.
Noélia desceu da boleia do caminhão e explicou ao garoto, que aquele objeto era uma flâmula que o nosso colégio trouxe de lembrança como um presente para o colégio dele.
Retornamos e ouvimos que brevemente Poções iria retribuir o convite ao Colégio Florestal. Provavelmente devido aos acontecimentos havidos na parte esportiva do voleibol, ninguém mais se atreveu a comentar o assunto e o convite de retribuição perdeu-se no esquecimento dos anos.
O tempo passou e chegamos ao dia 12 de outubro, numa noite fresquinha e estávamos passeando na Praça Deocleciano Teixeira, quando por volta das 21 horas, Nó acusou uma dor repentina, dizendo para mim:
--- Dy, senti uma pontada aqui em baixo da barriga.

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Noélia estava no nono mês de gravidez e a qualquer hora poderia nascer o nosso primeiro filho. De acordo com os cálculos feitos  pelo nosso amigo Bernardo Messias, baseado nas datas de nascimentos de Noélia e minha  ele nos disse alguns dias atrás, que seria um meninão bem robusto. Ressalte-se também, que naquela época não havia a aparelhagem que temos hoje em dia e cada palpite era diferente um do outro. Interrompemos o nosso passeio, levando-a à casa do Sr. Jambinho e avisei ao pessoal que iria procurar o Dr. Aloysio Rocha. Mas , lá por volta das 22 horas é que o Dr. Aloisio chegou e fez um primeiro exame em Noélia, afirmando que ela sendo PRIMÍPARA, a criança só iria nascer algumas horas depois.
Dona Jovelina, carinhosamente  chamada de “Meu Dó”, por todos da casa, era uma preta avançada nos anos,  que praticamente foi quem criou as meninas do Sr. Jambinho, tendo em vista que a mãe delas, Dona Alzira, já havia falecido há alguns anos atrás.(NÃO CHEGUEI A CONHECER AQUELA QUE SERIA A MINHA SOGRA).
Meu Dó, então, tratou de encher uma garrafa térmica com café, trazendo também vários tipos de biscoitos, onde colocou tudo aquilo, em cima de uma mesa, na sala de jantar, embora o pessoal da casa fizesse sempre as refeições na copa.
Percebi logo que o Dr. Aloísio não pretendia ir de volta para a sua casa, a fim de que fosse chamado mais tarde e ter de interromper o seu sono em plena madrugada. Assim começamos a conversar vários tipos de assuntos, sendo que o principal, para mim, era justamente parto, pois era completamente leigo no caso.
À medida que as horas passavam, recordei também, que há alguns anos atrás, por causa da política, ele e o Sr. Jambinho foram adversários políticos, como candidatos a Prefeito do Município. Os  anos haviam passado, e estávamos juntos sem que tivesse havido qualquer resquício de animosidade.
Enquanto nós  ficamos na sala, Noélia ficou deitada numa cama num quarto contíguo à mesma, pois ficaria mais fácil fazer qualquer atendimento. O tempo foi passando e o pessoal da casa começou a se recolher nos deixando à sós. Nó gemia de vez em quando e aí o Dr. Aloísio olhava o seu relógio de pulso e em certo momento comentou:
---Como eu já lhe disse essa criança, pelos meus cálculos só irá nascer ao raiar do dia de manhã.
E a nossa diversão, misturada com apreensão, era a de tomar café e comer biscoitos, vendo a noite despedir-se vagarosamente, dando lugar ao novo dia.
Era o dia 13 de outubro de 1959, uma terça feira. Alí por volta das sete horas da manhã, dando ao Dr. Aloísio, um trabalho incrível, nasceu a nossa primogênita Maria Sybele.

PRIMÍPARA: fêmea que dá a luz pela primeira vez.


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Contrariando todos os cálculos feitos pelo nosso amigo Bernardo Messias, ao invés de um garoto robusto e grande, nasceu uma garotinha bonitinha e toda marcada pelas ferramentas usadas na hora do parto. Foi normal, mas muito trabalhoso. Mas felizmente tudo ocorreu em paz e o pessoal já acordado, pode dar  também a sua mãozinha de ajuda na arrumação da bebezinha. Logo em seguida fui pessoalmente avisar a Papai e a Mamãe e esta me falou que logo após a arrumação de sua casa iria ver Nó.
À tarde, passou em frente da casa do Sr. Jambinho, uma procissão em louvor à Nossa Senhora de Fátima, onde algumas pessoas sugeriram registrar a menina com o mesmo nome da Santa, mas há muito tempo Noélia já havia escolhido os dois nomes: Leonard e Maria Sybele. Prevaleceu o segundo.
Dias depois ao encontrar-me com Bernardo Messias, e sabedor do erro, ele retrucou que foi algum dado que eu forneci erradamente. Como garanti ao mesmo que nada estava errado, ele me disse então, que no próximo filho, ele faria de novo as contas, para rentar acertar.
Como a nossa intenção era a de comemorar o primeiro aniversário de casamento, com a ainda pequena família, deixamos então, Sybele ficar mais recheiadinha e organizamos um almoço na sala de jantar da nossa casa alugada. Era o dia 8 de novembro, que caiu num dia de domingo, para facilitar o comparecimento de todos. Mas mesmo assim, domingo, era dificílimo e o Sr. Jambinho não pode comparecer. Desta forma contamos com as presenças de Amélia, Jurimar, Tereza, Papai e Mamãe. Tavinho havia viajado a serviço do INPS, pois era funcionário e também não pode comparecer. Naquele mesmo almoço divulgamos a todos os presentes que os padrinhos de Maria Sybele, seriam o Sr. Jambinho e Mamãe e recebemos muitos aplausos pela escolha feita.
O fato é que não tínhamos nenhuma experiência em cuidar da recém nascida e Nó começou a queixar-se que o seu leite era insuficiente para satisfazer a Sybele e desta forma passamos a dosar pequenas quantidades de leite em pó, misturando com água e intercalamos tais dosagens nos intervalos das mamadas. Num ponto deu tudo certo, pois Sybele começou a ganhar peso, entretanto, vivia constantemente com prisão de ventre, o que nos forçava a recorrer aos supositórios de glicerina, muito em moda na época.
Com algum dinheirinho que comecei a amealhar com os ganhos na Secretaria da Câmara, comprei na loja de Tavinho, uma bicicleta  da marca Mercksuic e com ela, corria mais apressado atrás do Dr. Aloysio , para trazer os remédios das necessidades de Sybele.
Chegamos também, ao final do ano letivo no Ginásio de Poções e a nossa missão estava cumprida.


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Noélia começou a dizer que o seu leite materno não estava mais saindo o que nos obrigava a dar uma maior quantidade de leite em pó misturado com água. Por outro lado, a menstruação ainda não voltara o que nos levou a consultar o Dr. Aloysio mais uma vez. Depois daquelas perguntas  de praxe, calmamente ele nos anunciou, que em setembro de 1960, nós receberíamos novamente a visita da cegonha. Ao chegarmos em casa, Nó apavorou com aquela notícia  e me disse:
---Dy, pelo amor de Deus, estou novamente grávida?
---Nó, por favor, entenda bem a situação. O que há de mal em termos o nosso segundo filho?
A coisa esteve preta nos dois primeiros meses de enjoo.
As aulas do ano letivo de 1960, recomeçaram e durante o segundo exame de admissão, já não houve mais a necessidade da presença do inspetor estadual .Nó, por sua vez, foi aceitando a segunda gravidez normalmente.
A turma da segunda série convidou os calouros para formarem um Grêmio Estudantil, que em eleição realizada pelos próprios alunos, recebeu o nome simbólico de “Ruy BARBOSA “. Elegeram como primeiro presidente, o aluno da segunda série ginasial, Carlos Ferreira Santos. Era um rapaz de boa índole, mas um pouco abobalhado em determinadas ocasiões. Basta citar um pequenino fato que ocorreu com o mesmo. Como as aulas eram ministradas no período matutino, para poder ganhar um dinheirinho, Carlos foi trabalhar na farmácia de Papai, no período vespertino e Papai tinha o hábito de ao chegar no final de cada mês, enviar uma cartinha aos seus clientes INADIMPLENTES, cobrando as suas dívidas na compra de remédios. Papai então para facilitar o trabalho de Carlos, colocava as cartinhas em ordem alfabética com os endereços  de cada um.
Num certo dia, Papai reuniu algumas cartinhas, chamou Carlos e lhe disse:
---Leve essas contas com a maior rapidez possível. Vá numa perna e volte na outra.
Esses dizeres de “vá numa perna e volte na outra”, eram sempre usados por pessoas que queriam o máximo de pressa em qualquer negócio. Mas o coitado do Carlos não conhecia aquilo e ao receber o pacote de cartas, saiu da farmácia pulando com uma perna no chão e a outra no ar e a medida que ia se afastando, trocava de perna, numa demonstração que atendera fielmente e ao pé da letra ao que Papai dissera.
Quando os dias iam se passando, os alunos sempre me procuravam, para que lhes desse alguns conselhos, na estrutura em organizar os diversos planos que lhes vinham em mente.
INADIMPLENTES: aquele(s) que não cumpre(m) as obrigações jurídicas estipuladas. Aquele(s) que não paga(m) o que deve.

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