O nosso parentesco com o poeta Castro
Alves, veio através de minha bisavó Odília, mãe de vovó Isaltina, que era prima
dele. Daí, todos os descendentes por parte de meus avós paternos tiveram o Alves em um dos sobrenomes.
Decorrido certo tempo de estada em casa
dos meus avós paternos, eis que os avós maternos reivindicaram a nossa presença
com eles, desde quando meu avô Manta, sendo médico, ele mesmo queria fazer o
parto da própria filha. Todos eles residiam na península itapagipana e bem
próximos por sinal.
Meus avós maternos ocupavam uma casa à Rua
Álvaro Cova, próxima a Igreja da Penha, enquanto vovô Afonso com sua família, residiam na Avenida Beira Mar,
se não me falha a memória, a casa possuía o número 321.
Papai era balconista da Casa de ferragens
Eduardo Fernandes, localizada na Cidade Baixa, perto do Plano Inclinado, onde
trabalhava das oito às 17 horas. Ele "tomava" um BONDE, logo cedo, almoçava lá mesmo e só voltava para casa ,quando
encerrava o seu serviço, à tardinha. Como possuía outras aspirações, nas horas
de folga, estudava para fazer os exames preparatórios, hoje chamados de
vestibular. Basta frisar, que as linhas de bonde que faziam o percurso da parte
baixa do Elevador Lacerda até a Ribeira e vice-versa, onde os passageiros
perdiam um tempo exagerado e por isso mesmo, Papai ia pela manhã ao trabalho e
só retornava quase ao escurecer.
No dia 17 de fevereiro de 1930, tal qual
tia Moema havia pedido, precisamente ao meio dia, nas mãos hábeis do Dr. Manta,
Mamãe deu a luz a um garotinho robusto, bonito pra caramba, cheiroso e que as
tias Licinha Edite e Dulce ficaram babando para pegá-lo. Irundy, como foi
registado posteriormente, veio ao mundo, para felicidade de todos. Papai só
tomou conhecimento do fato, ao retornar do trabalho à noite.
Meses depois, fui batizado na Igreja da
Penha, tendo como padrinhos, vovô Manta, vovó Amália e tia Licinha.
Em 1931, quando eu estava aniversariando
pela primeira vez, Papai brindou a todos, sendo aprovado nos Exames
preparatórios do Curso de Medicina. Ele e os proprietários da Casa Comercial
Eduardo Fernandes, entraram num acordo pra que só trabalhasse num turno, a fim
de não perder as aulas da Faculdade de Medicina, que era pertinho. Papai subia
para a Cidade Alta, pelo Plano Inclinado, saltava na Praça da Sé e dali seguia
andando até o Terreiro, onde ficava a antiga Faculdade de Medicina.
A vidinha deles dois foi seguindo em
frente e as minhas irmãs começaram a surgir de dois em dois anos.
Eliaci nasceu em dezembro de 1931,
Aryolinda em 1933, quando ocorreu o falecimento de Eliaci. Nair veio ao mundo em
1935 e faleceu no ano seguinte em 1936.
Nesse intervalo de tempo, toda a família
de vovô Manta mudou-se para a Rua Felisberto Carvalho 57, também conhecida como
Rua da Poeira.
BONDE: veículo
ferroviário elétrico, destinado ao transporte urbano e suburbano de passageiros.
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Já sabendo ler as notícias dos jornais, em março de 1936, fui
matriculado no Colégio Nossa Senhora de Lourdes, onde tia Dulce estava
concluindo o seu Curso de Magistério.
Ao final do ano de 1936, Papai formou-se em Medicina e aí o pessoal da
casa, resolveu fazer uma pequena comemoração.
Para ficar mais próximo dos
familiares, o meu tio Arnaldo (Nadinho), mudou-se para a mesma rua no número 40
e por isso mesmo, o filho mais velho, por nome Inaldo, me fazia companhia até a
escola, todos os dias.
A casa onde moramos na Rua da Poeira, 57, possuía um andar térreo,
ocupado por outra família e nós ficávamos no primeiro e segundo andares. Era um
sobrado.
Certa feita,
como os banheiros dos dois andares estavam ocupados, dirigi-me a um banheiro
que ficava no quintal, logo abaixo da janela da cozinha, que quase ninguém
usava, pois se descia dois lances de escada, com mais de vinte degraus em cada
uma.
Descendo-se o
primeiro lance chega-se a um pequeno patamar, onde a pessoa teria duas opções:
indo pela esquerda, desciam-se ainda uns quatro degraus seguindo para a porta
da rua. Tomando a parte da direita, é que se descia mais 20 degraus em direção
ao quintal. Desci o primeiro lance e quando galguei os primeiros quatro degraus
do segundo lance, avistei um individuo, junto a uma das paredes cortando uns canos
de chumbo de um encanamento antigo. De imediato, perguntei:
--- Que é que
você está fazendo aí, moço?
---Aqui não é
a casa do Sr. Matias? --- respondeu ele
---Matias?
Aqui é a casa do Dr. Manta, médico da polícia militar.
---É que eu
recebi ordens, para vir cortar esses canos de chumbo sem uso...
Depois desse
pequeno diálogo, desci mais rápido pelos degraus que ainda faltavam, até chegar
em frente ao banheiro e virando-me para cima, gritei bem alto:
---Joana, Joana! Acode aqui em baixo, que
tem um ladrão tentando roubar vários pedaços de cano.
Ao ouvir as
minhas palavras, o ladrão largou de imediato, tudo o que estava fazendo e
correu para cima, pela escada, a fim de fugir. Da parte debaixo onde eu estava,
ainda presenciei Joana chegando à tempo
de dar um SAFANÃO no ladrão, que mesmo assim,
ainda saiu correndo em direção a rua..
De passagem quero
apresentar a cozinheira Joana, que participou dessa história.
Era uma preta de mais ou menos
uns trinta anos, alta e robusta. Devia pesar entre setenta a oitenta quilos.
Vocês já pensaram como deve ter doído o que o malandro, recebeu do safanão
dela, no encontro que tiveram entre os dois no patamar da escada?.
SAFANÃO: Tapa forte com a mão aberta. Choque forte;
empurrão, tranco.
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