terça-feira, 26 de março de 2013

Autobiografia de Irundy Dias (p 13)


Com a ARC (Associação Recreativa Cruzeiro), entidade esportiva, sem nenhuma pretensão jurídica, criada apenas para participar de uns campeonatos da redondeza, nos inscrevemos em duas modalidades esportivas: futebol, onde participaram seis equipes e tivemos o grande privilégio de ficarmos com o honroso sexto lugar( último lugar no caso) e voleibol, que num jogo dramático, chegamos até a final e por azar de um dos nossos, que fraturou o dedo mindinho, orgulhosamente fomos vice-campeões.
Certa feita, Renato, como Presidente e incentivado muito por sua mãe, propôs que fizéssemos um passeio para pernoitar na Pituba. Sairíamos à tardinha do sábado, já levando inclusive uma feijoada pronta e naquele local faríamos um PIQUENIQUE e somente à tarde do domingo retornaríamos à Rua do Alvo. Durante a reunião, realizada na residência do próprio Renato, organizamos antecipadamente o rodizio, onde num intervalo de duas horas, cada dupla teria que ficar acordada, fazendo vigília, quando os demais componentes do grupo, estariam dormindo. Pelo sorteio realizado, iria fazer dupla com Chico e começaríamos às 4 da madrugada, estendendo o nosso turno  até as seis da matina.
Chegado o dia de sábado, saímos da Rua do Alvo às 15 horas, descendo a ladeira, galgando o Pelourinho, para então na Praça da Sé pegar o bonde que nos conduziria até o ponto final, em Amaralina. Dali até a Pituba, era uma caminhada a pé, onde pelo lado direito as ondas do mar nos acompanhavam e pelo lado esquerdo, dunas e mais dunas de areia. De vez em quando, surgia a cabana de algum pescador. Seguimos em frente, até que a turma de comum acordo achou um local bem agradável, próximo a muitos coqueiros. Já estava escurecendo quando acabamos de armar o acampamento, composto por duas barracas de lona, onde cada uma caberia folgadamente, entre quatro a cinco pessoas. Nosso jantar, havia sido preparado pela mãe de Renato e consistia de café quente feito na hora, pão com manteiga e pedaços de bolo de milho. Depois fomos passear pelas redondezas, onde vislumbramos aqui e ali, umas luzinhas vindas de barracas de pescadores. Provavelmente aquelas luzes eram de candeeiros ou de fifós acesos, pois Pituba naquela época, ainda era um bairro formado apenas por pescadores.
Após o reconhecimento do terreno, mesmo às escuras, o nosso acampamento era iluminado por um aparelho ALLADIM, cujo combustível era o querosene.
Quando começou o primeiro turno ás vinte e duas horas, o pessoal começou a recolher-se e eu também fui no embalo, pois às quatro horas teria que levantar-me. Mas foi uma noite tumultuada, porque ninguém dormiu direito. Quando chegou as nossa vez, sentimos que o tempo estava mudando. Um vento frio que vinha do mar e som provocado pelas ondas fortes, prenunciavam que o nosso piquenique, estava por um fio.
Até às cinco e pouco, Chico e eu aguentamos firmes, mas sentimos que uma garoa fina começava a cair sobre nós e aí trocamos um breve diálogo no sentido de avisar ao pessoal que o tempo estava virando e a chuva poderia aumentar e nos molharmos todos, principalmente os que estavam agasalhados ao calor das barracas. Avisamos primeiramente a Renato, que observando o tempo comentou:
---“vocês têm razão. Se ficarmos aqui, iremos nos molhar completamente. É melhor acordarmos a turma e arribar acampamento. É uma pena, mas o nosso piquenique falhou”.

PIQUENIQUE: passeio festivo, com refeição no campo, na praia ou no ar livre.

ALLADIM: nome comercial de um objeto metálico, com partes de vidro, contendo no seu interior uma peça de amianto, que funcionando a querosene, ilumina com luz forte, qualquer lugar.

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O retorno foi crucial. Uns colegas tentaram vir, somente usando as sungas de banho, enquanto a maioria vestia a roupa completa, com camisa e calça comprida. À medida que andávamos de volta a Amaralina, a chuva aumentava de intensidade de um vento exageradamente frio. O que na véspera foi um DELEITE para todos, naquela manhã cinzenta parecia que o tempo  desejava nos castigar. Imaginem, portanto a situação.
Cada um de nós, além de segurarmos as nossas ALPERCATAS de couro, trazíamos também, panelas enroladas, com todo o material da feijoada pronta, as peças das duas barracas, enfim um desastre total. O certo é que, depois de muito andarmos, até o final da linha de bondes, em Amaralina, todos nós estávamos molhados somente do lado esquerdo. Por incrível que pareça, o lado direito da roupa, estava completamente seco. É que o vento soprando muito forte fazia com que a chuva nos molhasse somente do lado esquerdo.  Aproveitando o embalo e com fome, sentamos numas mesas existentes naquele final de linha e fomos tomar café, em uma das barracas,  aproveitando os pães e bolos que havíamos levado. Quando o bonde apareceu, subimos e seguimos viagem até alcançarmos a Praça da Sé. Saltamos e descemos o Pelourinho. Atravessamos a Baixa dos Sapateiros e subimos a Ladeira do Alvo, sem que a chuva fortíssima tivesse nos dado um pouco de trégua sequer. Toquei a campainha da casa de Tia Edite, justamente na hora em que o pessoal preparava-se para almoçar. Foi um alvoroço bem grande, assim que me aproximei todo molhado. Tia Edite, foi logo dizendo:
“Dydy vá tomar um banho esperto e vista uma roupa bem seca, para não pegar uma gripe forte .


DELEITE: prazer íntimo. Satisfação.


ALPERCATAS: Alparcata. Alpargata. Sandália que se ajusta ao pé por tiras de couro ou de pano.
(Obs.)Na época, quando aconteceu o fato acima narrado, somente existiam esse tipo de alpercatas de couro ou pano.


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