sexta-feira, 19 de julho de 2013

Autobiografia de Irundy Dias ( página 14 )


Na outra praça, ficava a pensão do Sr. Arlindo Carvalho, a Igrejinha e mais umas duas ou três casas, sem qualquer destaque especial.
A República dos Viajantes, já citada, ficava bem ao meio da ladeira, onde hoje é o inicio da Avenida Cônego Pithon. Dali para cima, só se via matagal.
No dia então, que tio Júlio resolveu os seus afazeres comerciais, viajamos a Salvador.
A partir de 1941, comecei a participar de uma jornada por demais ingrata. Uma viagem de Salvador a Iguaí e vice-versa, girava em torno de quatro dias inteiros, se tudo ocorresse dentro dos "conformes". No primeiro dia, a viagem era de navio (o chamado "vapor", daquela época), que fazia o percurso de Salvador até Nazaré (a conhecida Nazaré das Farinhas, que tantas vezes, o nosso falecido amigo Carlos Tôrres, citava á respeito), Por sinal, era a viagem mais gostosa. Aquela brisa entremeada com as águas do Atlântico e do rio Paraguaçu. As canoas que traziam e desembarcavam passageiros. Os apitos sonoros do vapor, quando cruzava com outras embarcações. Os acenos das pessoas conhecidas. Enfim, era uma festa, que nos preparava para encarar o restante da jornada.
No segundo dia, partíamos de trem, de Nazaré com destino a Jequié, numa viagem horrorosa. Um trem mal cuidado, com bancos de madeira, poeira à beça, durante todo o trajeto. Às vezes, surgiam pessoas mal encaradas. Nas paradas das estações, entravam vendedores com alimentos, sabe-se lá como foram feitos, oferecendo aos passageiros, que em sua maioria, também compravam afoitos, naquela ânsia incontida, como se o mundo fosse acabar naquele momento. Estudante, como eu, considerado pobre, sempre, engolia em seco, mas, via aquilo tudo com asco e desprezo. Se tudo ocorresse bem, chegávamos a Jequié nas primeiras horas do anoitecer.
No terceiro dia, aí sim, era o sofrimento maior. Onde arranjar transporte?
Quando surgia um caminhão que viesse para Poções, era um corre-corre desmedido.
Não quero dizer, que todo aquele pessoal viesse para essas bandas, mas o certo é que desciam do caminhão ao decorrer da estrada. Se o tempo estivesse firme, com sol, um caminhão bem equipado (é até engraçado falarmos em caminhão bem equipado), o motorista conseguia viajar de seis a oito horas entre Jequié e Poções, contando-se todas as paradas necessárias.
No quarto dia, como os animais já estavam aqui de véspera, seguíamos até Iguaí, montados, sendo que o acompanhante levava a bagagem com ele.
 Como citei ao longo dessa página, se tudo, tudo fosse visto e ocorrido às mil maravilhas, contando-se quatro dias de vinda de Salvador e mais quatro de volta, lá se iam oito dias só em viagens. Então Papai achou melhor, que eu não viesse nas férias de meio de ano. Ia para as aulas em março e só retornava a Iguaí em dezembro.
No meio dessa sequência de viagens, ia a Salvador em fins de fevereiro ou principio de março e só voltava em meados de dezembro. Houve duas, que não podemos esquecer.
Numa delas, saímos da Salvador SEGUNDA-FEIRA (maiúsculas, para chamar atenção), com alguns colegas que no mesmo dia já estavam em casa, desfrutando do seu ambiente familiar. Em determinado momento, um deles disse assim:
“---Não suporto viajar. Olhem que eu vou saltar em Santo Antônio de Jesus, que é aqui pertinho. Antes do meio dia estarei em casa.”
Vale salientar, que foi construído um terminal marítimo no local chamado de Porto de São Roque, e o navio não prosseguia até Nazaré, pois o trem já estava ali aguardando todos os passageiros que iriam seguir viagem. Sendo assim, a nossa viagem já estava reduzida em um dia. Havia também um pequeno senão.


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